Acervo, Rio de Janeiro, v. 36, n. 1, jan./abr. 2023

Espaços urbanos e metropolização no Brasil (1940-1970) | Dossiê temático

O projeto brasileiro de regiões metropolitanas (1933-1973)

The Brazilian project of metropolitan regions (1933-1973) / El proyecto brasileño de regiones metropolitanas (1933-1973)

Julio Carmo

Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP). Professor da Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo e Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Brasil.

juliobotega@yahoo.com.br

Tomas Antonio Moreira

PhD em Estudos Urbanos pela Université du Québec à Montréal, Canadá. Professor associado do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), Brasil.

tomas_moreira@sc.usp.br

Resumo

Apresentando o debate sobre a institucionalização das regiões metropolitanas brasileiras, este artigo propõe-se caracterizar o movimento iniciado em 1933 até a promulgação da lei complementar federal n. 14, de 1973, tendo como método o levantamento bibliográfico e a consulta a documentos, periódicos e legislação. Como resultado, identificam-se os principais temas abordados e os debates no período, que culminaram no projeto brasileiro de regiões metropolitanas.

Palavras-chave: regiões metropolitanas; institucionalização metropolitana; legislação; história urbana.

Abstract

Presenting the debate on the institutionalization of Brazilian metropolitan regions, this article proposes to characterize the movement that started in 1933 until the enactment of LCF nº 14/73, using the bibliographic survey and consultation of documents, periodicals, and legislation as a method. The main topics addressed and the debate in the period were identified, which culminated in the Brazilian project of metropolitan regions.

Keywords: metropolitan regions; metropolitan institutionalization; legislation; urban history.

Resumen

Presentando el debate sobre la institucionalización de las regiones metropolitanas brasileñas, este artículo se propone caracterizar el movimiento iniciado en 1933 hasta la promulgación de la LCF nº 14/73, utilizando como método el levantamiento bibliográfico y la consulta de documentos, periódicos y legislación. Como resultado, identifica los principales temas abordados y el debate en el período, que culminó en el proyecto brasileño de regiones metropolitanas.

Palabras clave: regiones metropolitanas; institucionalización metropolitana; legislación; historia urbana.

Introdução

Para Cano (2011), a industrialização e as políticas macroeconômicas e de desenvolvimento regional no Brasil foram, entre 1930 e 1980, os determinantes da regionalização, integração do mercado nacional e desenvolvimento regional. O país tinha duas cidades de mais de um milhão de habitantes em 1960, cinco em 1970 e dez em 1980. Segundo o autor, em 1970, as nove regiões metropolitanas (RMs) oficiais possuíam 23,7 milhões de habitantes, uma década depois, 34,4 milhões, o que correspondia a 28,8% da população total. Esse crescimento intensificou o processo de conurbação, o que levou à conformação de áreas metropolitanas, transmitindo entre municípios vizinhos as potencialidades, mas também as mazelas e os problemas da urbanização. Superdimensionou ainda problemas de ordem municipal e solução local, transformando-os em questões regionais, estaduais ou federais. “Ao mesmo tempo, começou a surgir expansão da demanda de serviços públicos, fazendo com que as autoridades administrativas na área não pudessem mais, de forma isolada, solucionar satisfatoriamente as necessidades coletivas sem unificar as ações coordenadas de todas as escalas” (Grau, 1972, p. 5).

Daí a intensificação e criação de novos fluxos, caracterizadamente de natureza metropolitana: 1) fluxos de capitais, de mercadorias e serviços, em relação aos quais o núcleo central funciona como distribuidor, controlador dos bens e serviços consumidos em toda a área; 2) fluxos de pessoas que se deslocam dentro do complexo urbano, em direção aos locais de trabalho, de estudo, de compras, de lazer etc., formando os “movimentos pendulares”, que podem ter como ponto de partida o núcleo central ou os núcleos periféricos; 3) fluxos de comunicação, especialmente no que tange às comunicações telefônicas; 4) fluxos de informação, em função dos quais os habitantes de toda a área têm acesso aos mesmos jornais, às mesmas estações de rádio; entre outros. Para Oliveira Filho (2003), as RMs brasileiras foram idealizadas a partir das experiências dos Estados Unidos e da França, com suas instituições criadas para fins estatísticos ou de amenagément do território. O que pode se justificar, uma vez que, por mais que se tenha cautela na importação de modelos institucionais usados em países desenvolvidos, o fenômeno metropolitano constitui uma “realidade cultural, econômica, geográfica, urbana e ambiental antes que jurídica (Lomar, 2001, p. 39, grifo nosso).

O fenômeno metropolitano, do ponto de vista institucional, seria a área urbana que engloba multiplicidade e superposição de autoridades e competências político-administrativas (Grau, 1972). Entretanto, em decorrência do aparecimento de um município-núcleo onde se concentram tais funções, entre seus municípios contíguos e adjacentes passam a existir modalidades várias de integração. Em consequência disso, os limites socioeconômicos do complexo urbano não mais coincidem com os limites institucionais.

Numa primeira abordagem – desenvolvida a partir da situação brasileira – poderia se afirmar que uma área ou RM consiste numa realidade urbano-regional que se estende por um espaço geográfico dentro do qual se distinguem várias jurisdições político-territoriais, contíguas ou superpostas – segundo o nível de competência, seja local ou regional – formando uma mesma comunidade socioeconômica. Legalmente, os anteprojetos de lei complementar à Constituição federal de 1967 abordaram a questão de diferentes maneiras, mas, genericamente, conferiam ênfase específica ao elemento demográfico como caracterizador das áreas metropolitanas. Para Grau, “manifestam-se como polos altamente urbanizados e com marcante densidade demográfica, de intensa atividade econômica, ponto de localização concentrada destas atividades, dentro de uma porção de espaço considerada, condicionante de todo o comportamento econômico da região, visto que a sua expansão gera fluxos do exterior para o centro e do centro para o exterior”. E prossegue: “É um espaço polarizado, onde o polo de atividade econômica seria o núcleo urbanizado onde se concentra um volume relevante de atividade industrial, e consequentemente de serviços (setores secundário e terciário da economia), condicionante do comportamento econômico do espaço que polariza” (Grau, 1972, p. 7).

Do ponto de vista historiográfico, há um aparente consenso em dividir a institucionalização em duas fases. A primeira, a partir dos anos 1970, relacionada à expansão urbana e industrial, tinha esses espaços como prioritários, institucionalizados para a realização de funções públicas de interesse comum (FPIC), constituindo uma unidade de planejamento, organizada a partir de dois conselhos e uma secretaria executiva. Para Moura e Firkowski (2009), naquele momento prevaleceu o caráter político, não foi superado o conflito entre a institucionalidade e o fenômeno espacial, mas sua diferenciação foi agravada. Na segunda fase, após a Constituição de 1988, transferiu-se para os estados a prerrogativa de institucionalizar tais unidades (Moura et al., 2004; Bógus; Pasternak, 2009). Para Corte (2010), existiria uma terceira fase, a partir de 2001, de novas adequações institucionais, com marco inicial no Estatuto da Cidade. Contudo, considerando uma fase anterior à década de 1970 e priorizando o debate sobre a institucionalização das RMs brasileiras, neste artigo propõe-se caracterizar tal processo em um movimento iniciado em 1933, quando da elaboração do anteprojeto para a Constituição de 1934 até a promulgação da lei complementar federal n. 14, de 1973, que encerra um período de quarenta anos de discussão, tendo como método o levantamento bibliográfico e a consulta a documentos, periódicos e legislação. Ainda que não houvesse a questão metropolitana institucionalizada, a discussão regional e de articulação entre municípios já se colocava, conformando uma primeira fase apresentada neste artigo.

A discussão para um modelo e a articulação entre os municípios

A possibilidade do agrupamento municipal foi acolhida pela primeira vez na legislação brasileira no anteprojeto da Constituição de 1934, elaborado por uma comissão. O texto sugeria:

Art. 87 ‒ § 2º Os estados poderão constituir em região, com a autonomia, as rendas e as funções que a lei lhe atribuir – um grupo de municípios contíguos, unidos pelos mesmos interesses econômicos. O prefeito da região será eleito pelos conselheiros dos municípios regionais e o conselho regional compor-se-á dos prefeitos destes municípios. (Poletti, 1934)

Como observa Gouvêa (2005, p. 74), cada região seria administrada por um prefeito eleito indiretamente, cabendo aos estados, e não à União, a criação dessas regiões. Serrano (2009) afirma que o artigo não foi aceito por abrir precedente à criação de regiões como entidades federativas. Contudo, mesmo não efetivado, foi com a Constituição de 1934 que se tentou pela primeira vez enfrentar problemas regionais por meio do planejamento, como afirma Lima (2007). No artigo 177 destacava-se que: “A defesa contra os efeitos das secas nos estados do Norte obedecerá a um plano sistemático e será permanente, ficando a cargo da União, que dependerá, com as obras e os serviços de assistência, quantia nunca inferior a quatro por cento da sua receita tributária sem aplicação especial”.  Este artigo, de acordo com o autor citado, foi precursor dos organismos regionais criados a partir da Constituição de 1946. Contudo, anterior a esta, com o golpe de Getúlio Vargas que instaurou o Estado Novo em 1937, foi promulgada uma nova Constituição, que, ao contrário das anteriores, não seguiu a metodologia republicana clássica de realizar um anteprojeto elaborado por alguma comissão para ser posteriormente aprovada pelo Congresso. A Constituição de 1937 foi feita exclusivamente por Francisco Campos (Silva, 2008). Ele recuperou o parágrafo 2º do artigo 87 do anteprojeto da Constituição de 1934, incluindo-o no artigo 29, com o seguinte texto:

Art. 29 ‒ Os municípios da mesma região podem agrupar-se para a instalação, exploração e administração de serviços públicos comuns. O agrupamento, assim constituído, será dotado de personalidade jurídica limitada a seus fins.

Parágrafo único ‒ Caberá aos estados regular as condições em que tais agrupamentos poderão constituir-se, bem como a forma de sua administração. (Poletti, 1934)

Entretanto, de acordo com Gouvêa (2005, p. 76), não se registrou a instalação de nenhum agrupamento nos moldes propostos. Contudo, Monte-Mór (2006, p. 72) afirma que no Rio Grande do Sul se iniciava a confecção de planos diretores que incorporavam a problemática regional.

No âmbito continental, de acordo com Atique (2009), o terceiro Congresso Pan-americano de Arquitetos, realizado no Rio de Janeiro em 1930, teve como uma de suas bases a discussão sobre o processo de metropolização pelo qual passavam as cidades sul-americanas, sobretudo a partir dos planos de expansão urbana em andamento desde 1925 em Bogotá e 1927 em Santiago. Em 1940, no quinto congresso, realizado no Uruguai, recuperou-se novamente o crescimento das cidades. A partir de 1955, no nono congresso, realizado em Caracas (Venezuela), passou a se valorizar não apenas o urbanismo, mas o planejamento em suas diferentes escalas.

Como aponta Gorelik (2005), foi a partir da instituição da Cepal, em 1948, na cidade de Santiago, que a cidade e o território, bem como sua modernização, começam a ser enfrentados de forma mais sistemática. O ideário de que políticas públicas de reformas associadas à ação do planejamento poderiam resolver a explosão urbana no contexto do subdesenvolvimento passou a ser a tônica. O debate questionava o papel das grandes cidades, bem como seus efeitos negativos e as políticas de descentralização, com influência da experiência norte-americana no Tennessee Valley Authority, até as contribuições da economia espacial com Isard, Alonso e Perroux. Contudo, adverte o autor que

o tom geral desses debates será, desde o início, francamente antimetropolitano e descentralizador (só em finais dos anos de 1960 e começos dos de 1970 surgem algumas poucas vozes que levantam a hipótese da maior “eficácia” que, nos próprios termos da economia espacial, tiveram as grandes cidades na América Latina). (Gorelik, 2005, p. 121)

Em 1952, o grupo Economia e Humanismo publicou a Carta do Planejamento Territorial, ou Carta de La Tourette, pela qual defendiam a “vocação econômica do território”, destacando que “a delimitação das unidades de planejamento territorial depende quer de fatores geográficos, econômicos, demográficos ou étnicos, considerados isoladamente, nos quais se baseia a sua coesão, quer da combinação de alguns destes fatores”. Assim, o conceito de limite administrativo torna-se secundário, pois “os limites destas unidades não coincidem necessariamente com os das unidades administrativas ou políticas; elas não são rígidas no espaço, nem imutáveis no tempo” (Lebret, 1953).

Enquanto isso, no Brasil, em 1946, uma nova Constituição foi elaborada, quando mais uma vez deixou-se de fora o agrupamento ou qualquer forma de articulação possível entre os municípios. Priorizou-se novamente o planejamento regional, agora inspirado nos moldes da Tennessee Valley Authority americana, com o planejamento de bacias hidrográficas (Gouvêa, 2005). Além de artigos com referência ao planejamento regional no combate às secas e para o desenvolvimento da Amazônia (artigos 198 e 199), o texto estabelecia no artigo 29 que: “O governo federal fica obrigado, dentro do prazo de vinte anos, a contar da data da promulgação desta Constituição, a traçar e executar um plano de aproveitamento total das possibilidades econômicas do rio São Francisco e seus afluentes, no qual aplicará, anualmente, quantia não inferior a um por cento de suas rendas tributárias”.

Ainda que não constasse na Constituição, a articulação entre os municípios e a institucionalização desses agrupamentos continuaram sendo discutidas, por iniciativa dos municípios, dos estados, nas universidades, nas empresas privadas de planejamento e entre órgãos de classe como o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB). Como informa Lamparelli (1990, p. 289), “a questão urbana ainda não se destacava, mas estava latente nas contradições presentes entre campo e cidade e na questão nacional das desigualdades regionais”. Nesse sentido, entre a década de 1940 e o ano de 1973, uma série de estudos e tentativas de agrupamento entre os municípios seria realizada em diferentes estados. Entre as obras precursoras, destaca-se no Rio Grande do Sul, em 1943, o livro de Edvaldo Paiva, Expediente urbano de Porto Alegre, no qual apresentava a relevância do município-polo para sua região. Em Pernambuco, Antônio Baltar apresentou, em 1951, sua tese Diretrizes para um plano regional para o Recife, cujo objetivo central era “apresentar uma fórmula para expansão da cidade do Recife, capaz de atender a todos os aspectos urbanísticos deste problema, equacionando-o à luz da observação analítica da evolução, do estado do agrupamento urbano, e ainda da previsão do seu futuro”. Em 1956, Milton Santos publicou um artigo na Revista Brasileira dos Municípios denominado “O papel metropolitano de Salvador”, no qual destacava a importância histórica e as dificuldades de articulação da capital baiana, além de aspectos gerais, tais como os utilizados para definir o que seria uma RM.

Ainda em 1956, a prefeitura do município de São Paulo contratou a Sociedade para Análises Gráficas e Mecanográficas Aplicadas aos Complexos Sociais (Sagmacs) para a realização de um estudo sobre a “aglomeração paulistana”. De acordo com Lamparelli (1990), tal estudo foi o primeiro a tratar São Paulo como área metropolitana. O documento publicado em 1957, "Estudo da estrutura urbana da aglomeração paulistana", coordenado pelo padre Lebret, foi realizado em parceria com a Comissão de Política Urbana do Município de São Paulo.

O padre Lebret também utilizara seu método em estudo realizado em 1954 para a região de Recife, onde conheceu Antônio Baltar. Das discussões sobre planejamento regional no Nordeste, em Pernambuco e para o Recife, Baltar et al. (1956) publicaram Teses e conferências sobre problemas de urbanismo e área metropolitana. Destaca Lamparelli (1990) que, do contato travado com o padre Lebret, houve a aderência de Baltar aos princípios do Movimento Economia e Humanismo, contribuindo, quando da sua participação no Seminário de Técnicos e Funcionários em Planejamento Urbano realizado em Bogotá, Colômbia, na formulação da Carta de los Andes, documento que contém diretrizes para o planejamento metropolitano no contexto sul-americano de desenvolvimento.

Em 1958, por meio da Carta de los Andes, seria a vez dos latino-americanos se manifestarem sobre o metropolitano. O tema II do documento é específico sobre as “características do planejamento regional metropolitano e urbano na América Latina”. O documento define como deveria ser um órgão de planejamento (Cinva, p. 5), constituído por dois elementos, uma comissão de planificação e um escritório técnico.

Identifica ainda os problemas específicos das maiores cidades, como congestionamento, deterioração, desemprego, patologia social, entre outros, indicando ainda serviços que poderiam ser comuns aos municípios, com destaque para o zoneamento e uso da terra, que deveria aplicar “energicamente as restrições ao uso da terra, recomendadas pelos planos” (p. 12). Surgiu então uma variedade de modelos institucionais para a elaboração e execução de planos metropolitanos, utilizados até a década de 1970. Como definiu a Folha de São Paulo, em 1967 (p. 23),

em geral, o processo de metropolização tem provocado nas áreas em que se desenvolve os mais complicados problemas administrativos. Colocando a urbanização numa escala que ultrapassa de muito os limites do município, acarreta a rápida obsolescência e o colapso da velha estrutura municipal [...]. Uma nova escala de demanda, desconhecida em épocas precedentes, esgota rapidamente os recursos dos municípios, torna obsoletas as técnicas disponíveis e congestiona os vários setores da vida local.

No Simpósio de Geografia Urbana da Associação de Geógrafos Brasileiros (AGB), na cidade de Vitória (ES), em 1959, definiu-se que existiam duas categorias de metrópoles no Brasil: as metrópoles nacionais (São Paulo e Rio de Janeiro) e as metrópoles regionais (as outras seis). Seriam denominadas como áreas metropolitanas ou “grande aglomeração da cidade ‘X’”, ou somente “Grande ‘X’”, e formadas por uma parte urbana e outra suburbana, sendo a primeira definidora da aglomeração urbana, de ocupação contínua, ou seja, o núcleo principal (Geiger, 1963). Publicou o autor, no trabalho citado, um mapa em que dividia o Brasil em regiões urbanas, polarizadas por metrópoles1 (Figura 1).

No início da década de 1960, Araújo Filho (1996) afirma que era crescente entre técnicos e acadêmicos a preocupação com a questão metropolitana. Dessas preocupações resultou, por exemplo, o Seminário de Habitação e Reforma Urbana, realizado pelo IAB em 1963, cujo documento final apontava a necessidade de ações cooperativas e a criação de órgãos que administrassem, de forma consorciada, os problemas comuns de municípios (Araújo Filho, 1996, p. 54). Nesse momento, diferentes estados já reconheciam o fenômeno metropolitano e iniciavam experiências de gestão intermunicipal.

Mesmo no exterior, eram realizados estudos contemplando a realidade metropolitana. Houve a implantação de uma Comissão de Organização Administrativa das Áreas Metropolitanas do V Congresso Hispano-Luso Americano-Filipino de Municípios, realizado em Santiago do Chile, em 1969, do qual resultou o documento intitulado "Proyecto de acuerdo sobre organización administrativa de las áreas metropolitanas". Em 1961, estudo da Universidade da Califórnia utilizou os critérios norte-americanos para definir quais seriam as áreas metropolitanas no mundo todo, inclusive no Brasil, como mostra a Figura 2.


Figura 1 – Divisão do Brasil em regiões urbanas. Fonte: Geiger (1963). Adaptado pelo autor



Figura 2 – RMs no Brasil em 1960, definidas por estudo da Universidade da Califórnia, com base nos critérios estadunidenses. Fonte: Universidade da Califórnia (1961). Elaborado pelo autor


De acordo com Azevedo e Guia (2015, p. 99), com o golpe civil-militar de 1964 tais experiências foram abortadas, quando da redução das instituições democráticas e concentração de poder no âmbito federal. Contudo, uma série de experiências continuaram sendo pensadas ou postas em prática na maioria dos estados onde seriam definidas as RMs na lei n. 14, de 1973, por iniciativas municipais e estaduais voluntárias para o agrupamento de municípios.

A partir de 1960, teve início a criação de associações de municípios no país ligadas às superintendências regionais (Cembs, 1971). As mais antigas estavam na região Sul, sendo a primeira a Associação dos Municípios do Vale do Rio dos Sinos (AMVRS), com sede em Novo Hamburgo (1960), que a partir de 1967, por iniciativa da prefeitura de Porto Alegre, passou a compor a Associação Metropolitana de Municípios (Amem).3 Em 1970, foi criado o Conselho Metropolitano de Municípios (CMM) e o Grupo Executivo da Região Metropolitana de Porto Alegre (GERM), com representação dos governos municipais, estadual e do Ministério do Interior (Minter), por meio da Superintendência de Desenvolvimento da Região Sul (Sudesul). Alonso (2008) destaca que em 1971 o governo alemão enviou um grupo de especialistas em planejamento regional para trabalhar com a equipe do GERM, o que resultou na elaboração do Plano de Desenvolvimento Metropolitano (1973).

Em São Paulo, de acordo com o Ipea (2013), o processo de institucionalização da área metropolitana foi iniciado na década de 1960, resultado dos trabalhos realizados pelo IAB, entre os quais o documento "Critérios de encaminhamento do planejamento territorial da região da cidade de São Paulo" (1965), resultante do seminário de mesmo nome, que prosseguia com as discussões do seminário O Homem e a Paisagem Paulistana, realizado um ano antes. Entre as conclusões e recomendações do encontro, destacamos:

A institucionalização do planejamento metropolitano recomenda a criação, pela União, pelo estado ou pela associação dos municípios interessados, de um órgão técnico específico, que coordene os serviços de planejamento dos três níveis de governo. Compete ao governo federal [...] institucionalizar corretamente o conceito de região metropolitana. [...] que as atuações setoriais do governo estadual na região metropolitana de São Paulo sejam coordenadas por um órgão técnico de planejamento regional, entrosado com as administrações municipais. [...] que o planejamento global e parcial, realizado no município de São Paulo, é o mais importante para a região metropolitana e é também o mais urgente de todos.

Para Mori (1996, p. 227), as recomendações mostram a postura do IAB de São Paulo em relação ao tema a partir de duas perspectivas: “a função eminentemente técnica atribuída à entidade metropolitana, sem contemplar, portanto, a natureza política da questão enfocada” e “apesar da evidente preocupação do documento com a ‘correção’ da forma a ser dada à nova entidade, acaba por inscrever o processo de planejamento nos limites de um entrosamento entre municípios”. A partir de 1969, desenvolveu-se o Plano Urbanístico Básico (PUB) para o município de São Paulo, em que as proposições se limitavam ao território municipal, mas as análises abrangiam toda a área metropolitana (p. 234). O “PUB é o futuro”, destacava reportagem da Revista Veja de 9 de abril de 1969, com suas ambiciosas proposições, como a ampliação da rede de metrô de 66 para 450 km e a construção de um sistema de vias expressas de 850 km na área metropolitana (Veja, 1969, p. 43). Em 1970, foi publicado o Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado, desenvolvido pelo Grupo Executivo da Grande São Paulo (Gegran), criado em 1967. Em 1972, foi apresentado à Casa Civil da Presidência da República um anteprojeto de lei complementar específico para a criação da RM da Grande São Paulo, elaborado pelo governo do estado de São Paulo e pela prefeitura da capital. Foi desenvolvido pela Logos, com consultoria de Jorge Wilheim, por contratação do Gegran, publicado na íntegra no jornal O Estado de São Paulo de 29 de setembro de 1972 (p. 20).

Wilheim teria papel proeminente nos anos seguintes na discussão de planejamento urbano, metropolitano e regional no Brasil. Participou como consultor em uma série de planos e estudos metropolitanos. Também publicou São Paulo: metrópole 1965, foi um dos idealizadores do I Encontro Nacional de Arquitetos Planejadores, realizado em Curitiba em 1966, e consultor junto ao Ipea e ao Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (Serfhau) das “Bases de política urbana para o desenvolvimento dos nove polos metropolitanos” (1968). Participou da elaboração do Plano Preliminar de Urbanismo (PPU) de Curitiba, acompanhado desde 1965 pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ippuc) da cidade, ao qual estava vinculada a Secretaria de Coordenação Regional (Secore), previstos no plano. Grau (1972, p. 133) destaca que “o primeiro convênio lavrado entre municípios, para o estudo de problemas metropolitanos, foi o firmado pelos integrantes da região metropolitana de Curitiba”, remetendo-se ao convênio n. 1 de 1967, entre Curitiba e os municípios que viriam a compor sua RM. Também com assessoria de Wilheim, em Minas Gerais, em 1971, foi criado um grupo de estudos na Fundação João Pinheiro para caracterizar e definir a RM de Belo Horizonte, que daria origem à Superintendência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Plambel), que publicou, em 1972, o Plano Metropolitano de Belo Horizonte. Prestou assessoria, ainda, no Ceará, como consultor do Plano de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Fortaleza (Plandirf), que tinha como um dos seus objetivos instituir um sistema administrativo de planejamento para a RM (Accioly, 2008).

Em Pernambuco, após o estudo já citado de Baltar, em 1971 se instituiu o Conselho de Desenvolvimento de Pernambuco (Condepe) e o Grupo de Trabalho para o Plano de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Recife (GDRM). Em 1970, com consultoria de Wit-Olaf Prochnik, foi elaborado o Estudo Preliminar para o Plano Integrado de Recife. No Pará, a prefeitura de Belém criou em 1970, pela lei municipal n. 6.795, a Companhia de Desenvolvimento da Área Metropolitana de Belém, cuja finalidade era o ordenamento sociopolítico e econômico da área metropolitana, a ser realizado por meio da elaboração de planos e projetos, dos quais se destacam o Plano de Desenvolvimento da Grande Belém, Plano de Estruturação Metropolitana e o Plano de Desenvolvimento Metropolitano. No então estado da Guanabara, em 1964, foi criada a Comissão Executiva para o Desenvolvimento Urbano da Guanabara (Cedug), que contratou Doxiadis para elaboração do plano de desenvolvimento urbano para a região do Grande Rio. Extinta em 1966, foi absorvida pela Secretaria de Planejamento. No estado do Rio de Janeiro, foi criada a Comissão de Planejamento da Grande Niterói (CPGRAN) em 1969, incorporada ao Conselho de Planejamento e Coordenação do estado em 1971. Por fim, a iniciativa de agrupamento partiu do governo federal, uma vez que os municípios metropolitanos se localizavam em dois estados, criando o Grupo de Estudos da Área Metropolitana (Germet). Convém ressaltar que, por meio do decreto federal n. 62.654, de 1968, o governo federal criou a Coordenação de Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana do Grande Rio, confirmando o protagonismo concedido à questão habitacional na definição das RMs, mas que, entretanto, não constaria entre os serviços públicos de interesse comum que seriam definidos em 1973.

Todas estas RMs, que foram depois definidas pela lei complementar federal n. 14/1973 e n. 20/1974, participaram em 1967, em São Paulo, do Simpósio sobre Regiões Metropolitanas promovido pelo Serfhau, tendo previamente elaborado relatórios sobre suas regiões. O conhecimento prévio dos estudos que levariam o governo federal a estabelecer nove RMs motivou aquelas que não seriam institucionalizadas a também elaborarem estudos metropolitanos. Entre aquelas que não foram institucionalizadas, destaca-se que em janeiro de 1968 foi criado o Convênio da Grande Vitória, regulamentado no ano seguinte, envolvendo cinco municípios (Vitória, Vila Velha, Cariacica, Viana e Serra) e estabelecendo a Comissão de Planejamento Integrado da Grande Vitória (Copi). Seu objetivo era elaborar um plano de desenvolvimento integrado para a região, bem como orientar as municipalidades e divulgar técnicas de planejamento e formação de pessoal especializado. A dita comissão originou em 1969 a Companhia de Melhoramentos e Desenvolvimento Urbano S.A. (Comdusa), empresa de economia mista com o objetivo de realizar estudos e pesquisas necessárias à elaboração de um plano diretor para a Grande Vitória (IJSN, 1979 apud Ipea, 2013). Chama a atenção que Vitória não tenha sido incluída na lei n. 14/1973 pois: 1) havia ações de institucionalização da Grande Vitória; 2) é uma cidade capital; e 3) o autor da emenda que incluiria pela primeira vez a expressão “região metropolitana” em uma Constituição Federal (elaborada em 1967) foi o senador pelo Espírito Santo, Eurico Resende. Como pode se observar por meio das experiências relatadas, o planejamento metropolitano e as RMs estavam no centro do debate urbanístico na década de 1960.

Em 1967, a Folha de São Paulo publicou um suplemento especial apenas sobre a RM de São Paulo, intitulado “Grande São Paulo: o desafio do ano 2000”. O documento, com 432 páginas distribuídas em nove volumes, buscava realizar um diagnóstico da região, incluindo aspectos quantitativos e qualitativos, além de propostas e soluções projetadas até o fim do século, onde, citando o padre Lebret, constituía-se o “maior desafio urbanístico do mundo” (Folha de São Paulo, 1967, p. 3). O jornal passou a estampar em sua capa semanalmente a divulgação do caderno especial com informações sobre os municípios da Grande São Paulo. Em reportagem de capa de 9 de abril de 1969, a revista Veja questionava: “Londres tem um superprefeito. Paris constrói cidades satélites, Nova Iorque procura novas áreas recuperando alagados. E as grandes cidades do Brasil?”. Jornalistas viajaram para São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Belo Horizonte e Porto Alegre, então as seis maiores aglomerações urbanas do país. De acordo com a reportagem, dois fatos chamavam mais a atenção: 1) “a febre do crescimento está definitivamente instalada, mas a doença não assusta porque tem diagnóstico e tratamento – grandes planos já estão sendo executados ou estão no ponto de começar”; e 2) em todas as cidades visitadas já se fala em área metropolitana, em planos integrados; em algumas, além de São Paulo e Rio, até em metrô” (Veja, 1969, p. 11).

Em Recife, a reportagem destacava a preocupação do então prefeito Geraldo de Magalhães Melo com o inchaço da cidade e da área metropolitana e a necessidade do plano diretor metropolitano que “procurará certamente descentralizar Recife, desafogando o seu centro tradicional onde a circulação é dramática, valorizará as praias, [...] integrará a área metropolitana que faz o Grande Recife e dará normas para a expansão. Foi-se o tempo de governar com placas. Estamos na hora dos planos” (Veja, 1969, p. 47). Prosseguiu o prefeito, afirmando: “vou dar a Recife um plano diretor. Um senhor plano diretor, capaz de projetar a expansão da cidade e solucionar definitivamente os problemas básicos”. Sobre Porto Alegre, a reportagem destacava que era “provavelmente de todas as capitais brasileiras a um só tempo a mais integradora e a mais integrada. Isto pode facilitar um projeto para a área metropolitana, capaz de planejar globalmente a Grande Porto Alegre e de selecionar uma extensa área industrial defendida por alguns técnicos contra os distritos industriais” (p. 49).

Percebe-se que a ideologia do plano e as obras físicas, sobretudo viárias, eram colocadas como promissoras demonstrações da preocupação com o futuro das áreas metropolitanas. Em poucos anos se tornariam o esteio dos problemas metropolitanos, onde a população deveria depositar sua confiança, como demonstra a edição de 4 de abril de 1973 da mesma publicação.

Portanto, o conhecimento acumulado sobre a realidade metropolitana foi aprofundado a partir de 1964, resultando no modelo brasileiro de definição de RMs. Wald (1972) considera que, ainda que a Constituição Federal de 1937 previsse a colaboração entre municípios, a RM só foi efetiva a partir da Constituição Federal de 1967, resultado de um debate que teve diversas contribuições. Determinava, em seu artigo 157, que “a União, mediante lei complementar, poderá estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independentemente da sua vinculação administrativa, integram a mesma unidade socioeconômica, visando à realização de serviços comuns”. Com a crescente urbanização e mudanças institucionais ocorridas no Brasil após o golpe militar de 1964, a partir de 1966 o então presidente Castelo Branco instituiu uma comissão de juristas para reformar a Constituição Federal de 1946. Ainda que observado, o fenômeno metropolitano não tinha uma base jurídica à qual se referir. Tais juristas preconizaram então duas soluções para a questão metropolitana. A primeira, no título V, capítulo I, seção V, artigo 246 do anteprojeto, admitia que

a União ou o estado poderá estabelecer temporariamente por lei, com a concordância das Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas, áreas de desenvolvimento prioritário, nas quais realizará as obras e serviços necessários ao reerguimento socioeconômico conveniente da região. Realizadas as obras e os serviços programados, voltarão as áreas à administração do município a que pertencer. (Brasil, 1966)

No artigo 247 constava a segunda solução: “Os estados poderão, mediante autorização de dois terços dos membros de suas Assembleias Legislativas e das respectivas Câmaras de Vereadores, estabelecer administração conjunta de alguns municípios, visando à realização de obras ou serviços públicos, ou a outros objetivos de interesse comum”. Para Horta (1975), a primeira solução se inspirava nos moldes do desenvolvimento regional, atrelado ao suprimento de carências. A segunda, de acordo com o autor, apontava na direção das RMs, sob a forma de administração entre municípios, visando à realização de obras, serviços públicos ou outros objetivos de interesse comum. Contudo, afirma o autor que ambas as soluções foram ignoradas no projeto da Constituição Federal enviada ao Congresso em 12 de dezembro de 1966. A expressão “região metropolitana” foi então introduzida em texto constitucional, pela primeira vez, como resultante do anteprojeto denominado Projeto de Reforma da Constituição Federal no Setor Municipal, elaborado por Hely Lopes Meirelles para a reforma da Constituição Federal de 1946, a pedido de Milton Campos, então ministro da Justiça. Com a mudança de ministro, que passou a ser Carlos Medeiros, tal texto extraviou-se, o qual, posteriormente, passou por alterações, retornando como emenda aditiva, proposta pelo senador Eurico Rezende. A justificativa do senador para a emenda era a seguinte:

As regiões metropolitanas constituem hoje em dia uma realidade urbanística que não pode ser desconhecida das administrações modernas, nem omitida no planejamento regional. Por regiões metropolitanas entendem-se aqueles municípios que gravitam em torno da grande cidade, formando com esta uma unidade socioeconômica, com recíprocas implicações nos seus serviços urbanos e interurbanos. Assim sendo, tais serviços deixam de ser de exclusivo interesse local, por vinculados estarem a toda a comunidade metropolitana.

Passam a constituir a tessitura intermunicipal daquelas localidades, e, por isso mesmo, devem ser planejados e executados em conjunto, por uma administração unificada e autônoma, mantida por todos os municípios da região, na proporção dos seus recursos e, se estes forem insuficientes, hão de ser complementados pelo estado e até mesmo pela União, porque os seus benefícios se estendem aos governos estadual e federal. Eis porque a emenda propõe o reconhecimento constitucional dessa realidade, possibilitando a unificação dos serviços intermunicipais de regiões metropolitanas, subvenção estadual e federal, se necessário, para o pleno atendimento da imensa população que se concentra nessas regiões. (Congresso Nacional, 1967, p. 129-130)

Por fim, a emenda n. 848 foi assim redigida:

A União, mediante lei complementar, poderá, para a realização de serviços comuns, estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa, integram a mesma comunidade socioeconômica.

Adite-se ao artigo 157 o seguinte parágrafo:

§ 9º ‒ A União, mediante lei complementar, poderá estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa integrem a mesma comunidade socioeconômica, visando à realização de serviços de interesse comum. (Congresso Nacional, 1967, p. 129)

A emenda foi incorporada ao texto constitucional como parágrafo 10 do artigo 157, que se transformou posteriormente no artigo 164 da emenda constitucional n. 1 de 1969. Foi modificada parcialmente a redação adotada em 1967, para enfatizar a realização de serviços comuns com o objetivo do estabelecimento das RMs. Foi definida por Horta (1975, p. 33) como um dos “instrumentos inovadores” implantados pela Constituição Federal de 1967, que impunha ao governo federal o comando da política de desenvolvimento regional. Wald (1972, p. 150) também se referiu às RMs como “um novo instrumento de correção da rigidez originária do sistema federalista e um meio de racionalização dos grandes centros urbanos”. A emenda, de acordo com Horta (1975, p. 36), foi inspirada no trabalho de Hely Lopes Meirelles com algumas modificações: somente a União poderia estabelecer RMs; deveriam ser criadas via lei complementar federal; foi suprimida a possibilidade da administração unificada de caráter intermunicipal; e a solução proposta por Meirelles incluía a RM no setor constitucional reservado aos municípios, como parte do todo. A emenda operou a desvinculação entre RM e município, administração municipal e autonomia municipal.

Para Horta (1975), entretanto, a emenda ficou mergulhada entre mais de 1.500 apresentadas à Constituição Federal e o relator da comissão mista que apreciou o título III – da Ordem Econômica – do projeto não fez qualquer destaque à nova forma de organização, o que não permite avaliar as razões que balizaram sua adesão. Wald (1972) destaca o fato de que a princípio a proposta foi apresentada como inciso 10 do artigo 157 da Constituição Federal de 1967, sendo elevada, a partir da emenda n. 1/1969, a artigo próprio (artigo 164), que não alterou substancialmente o que determinava a Constituição Federal de 1967, resultando no seguinte texto: “A União, mediante lei complementar, poderá, para a realização de serviços comuns, estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa, façam parte da mesma comunidade socioeconômica”.

Comunidade socioeconômica seria caracterizada como o produto do desenvolvimento de grande área urbana e das localidades periféricas que recebem os reflexos da concentração demográfica e da expansão industrial, que caracterizariam a RM (Horta, 1975, p. 37). A partir dessa definição, os juristas passaram a discutir o que seria função metropolitana e interesse metropolitano. As funções metropolitanas, para Grau (1972, p. 9), podem ser consideradas a partir de duas acepções: expressar atividades privadas exercidas no espaço metropolitano ou referir tipos específicos de atuação governamental. Esta segunda concepção atuaria de forma a satisfazer as demandas da primeira, a qual condiciona as necessidades metropolitanas. A atuação governamental na segunda acepção é a qual os técnicos e teóricos tentaram responder no Brasil, pois as funções privadas metropolitanas exigem “atuação coordenada, em conexão e integração, e seu sucesso depende de uma anterior atividade de planejamento, que lhe dê suporte” (Grau, 1972, p. 13). Já no Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado da Grande São Paulo, elaborado pelo Gegran em 1971, definem-se serviços de interesse comum como

atividades e serviços urbanos, ou parte destes, que, pela natureza de sua disciplina, implantação ou operação, resultem em conexões e interferências recíprocas entre os diferentes municípios, exigindo ação unificada e planejada que ultrapasse seus limites institucionais. Para que o conceito possa ser aplicado indistintamente, a qualquer realidade metropolitana, basta que se substitua a expressão “diferentes municípios” por “diferentes unidades administrativas com atuação na área”. (Gegran, 1971, p. 189)

O fundamento constitucional da RM residiria, portanto, “exclusivamente na realização de serviços comuns aos municípios integrantes da mesma comunidade socioeconômica”, instituindo-se como executora de serviços comuns, não resultando em novo nível de governo ou em circunscrição político-administrativa. Já os interesses metropolitanos, para Grau (1972, p. 41-42), são aqueles que geram efeitos que extrapolam os limites territoriais de várias autoridades e unidades administrativas, necessitando de soluções coordenadas e integradas de parte das autoridades e unidades. Para Azevedo (1976, p. 21), a competência dos municípios decorre da predominância dos interesses locais sobre os regionais ou nacionais, sendo o objeto das RMs a realização de “serviços comuns”, que seriam aqueles em que a predominância do interesse se desloca do município para a região. A área abrangida teria a necessidade de uma ação conjunta para permitir o enfoque adequado dos problemas que, pela singularidade da região, ultrapassassem a possibilidade de solução isolada. A juricidade do conceito de interesse predominantemente metropolitano possibilitaria ao Estado intervir na área metropolitana para atendê-lo, ainda que se alegue que isso implica infringir a autonomia municipal, o que não ocorre, de acordo com alguns juristas, uma vez que os municípios continuariam com administração própria quanto ao que fosse de seu interesse predominante. Para Alves (1979), contudo, a forma adotada não contempla os pressupostos necessários à preservação efetiva da autonomia local, a par de impedir uma mais perfeita integração entre todos os níveis governamentais, incluindo a União (p. 121-122). Inserido no título constitucional “Ordem econômica e social”, a inclusão da emenda visava, de acordo com Horta (1975), à realização de justiça social, singularizando a RM dentro do direito constitucional brasileiro, diferenciando-a de modelos estrangeiros e originando um projeto genuinamente nacional de institucionalização. Critica o autor alguns legisladores que buscavam soluções baseadas em modelos estrangeiros, exaltando o que definiu como “projeto brasileiro de região metropolitana” (p. 38), expressão que compõe o título deste artigo.

Esse cenário de discussão para regulamentar os agrupamentos de municípios, sobretudo a partir da Constituição Federal de 1967 e da emenda n. 1 de 1969, fez com que o Ministério da Justiça fosse requisitado a propor um projeto de lei que criasse as RMs. Com a dimensão que a questão metropolitana tomou e as divergências entre os diversos ministérios, os técnicos do Ipea foram chamados a analisar o anteprojeto proposto pelo Ministério da Justiça. Foi elaborado pelo instituto um documento, publicado em 1971, que destaca (Ipea, 1971, p. 143) que entre 1967 e 1968 foram apresentados nove projetos para a institucionalização de RMs, que os autores dividiram em três grupos:

1) Projetos que visavam à constituição de RMs isoladas: projeto n. 23/1967, de autoria do deputado Paulo Biar, criava a RM na área abrangida pelos municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São João de Meriti, Nilópolis, Magé, Itaguaí e Itaboraí. Para o Ipea (1971, p. 143), contudo, “ainda que pertencentes a uma mesma comunidade socioeconômica, esses municípios constituem, na verdade, uma parte da grande área metropolitana do Rio de Janeiro, não apresentando todos eles integração entre si e sim com o Rio de Janeiro ou Niterói (no caso de Itaboraí)”; projetos n. 38/1967, do deputado Milton Reis, e n. 44/1968, do deputado Rozendo de Souza, que previam a instituição de RMs em Minas Gerais entre os municípios de Ipatinga, Timóteo e Coronel Fabriciano e no Rio de Janeiro (Volta Redonda e Barra Mansa). O Ipea (p. 143) avaliava que eram “dois casos análogos: importantes núcleos industriais em expansão, onde se processa o fenômeno de conurbação expresso pela continuidade da malha urbana. Não são o caso, contudo, de metrópoles de expressão regional, cidades que comandam sistemas de cidades”; projeto n. 53/1968, do deputado Luiz de Paula, que previa a criação da Grande Região dos Montes Claros, onde os municípios estavam na área de influência regional de Montes Claros. Para o Ipea, não se justificaria tal proposta uma vez que não havia “conurbação e não é um núcleo urbano de expressão metropolitana. Estes fatos afastam a possibilidade de face aos conceitos correntes de área metropolitana, se aceitar a instituição de uma entidade metropolitana para Montes Claros, nos termos da Constituição” (p. 143); projeto n. 57/1968, do deputado Passos Pôrto, que definia a RM de Aracaju. Para os técnicos do Ipea, ainda que a cidade fosse capital estadual, os municípios indicados no projeto formavam sua área de influência imediata e não, a rigor, uma área metropolitana. Destacam também que o fenômeno de conurbação se revelava em escala muito reduzida – somente com o município de Barra dos Coqueiros; projeto de autoria do deputado Henio Romagnolli sobre a RM de Curitiba. Para o Ipea, tratava-se de

uma capital estadual cuja função metropolitana foi reconhecida nos estudos sobre hierarquia urbana realizados pelo Ipea/CNG, e que vem apresentando o tipo de crescimento característico referido. Sua instituição como região metropolitana, nos termos da Constituição, deverá se processar tão logo seja aprovada a lei complementar de caráter normativo. (Ipea, 1971, p. 143)

2) Projetos n. 31/1967, de autoria do deputado Paulo Macarini, e n. 32/1967, do deputado Raul Brunini: propunham o estabelecimento imediato das RMs e a forma institucional pela qual deveriam ser organizadas. O segundo previa “a instituição do órgão metropolitano mediante convênio da União com estados e municípios e especifica nove regiões, que correspondem às nove metrópoles nacionais e regionais, cuja condição metropolitana foi reconhecida nos estudos realizados pelo IBG/Ipea”. O primeiro previa vinte regiões, sendo nove as reconhecidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e as demais abrangiam “os municípios que circundam quase todas as capitais estaduais. Dessas onze outras, apenas algumas acusam o fenômeno do crescimento conurbado e nenhuma tem uma função metropolitana”;

3) Por fim, o projeto do deputado Dahil de Almeida, n. 48/1968, de caráter normativo e o mais próximo do anteprojeto elaborado pelo Ministério da Justiça. Considerava que “só os municípios de um mesmo estado poderão se organizar em regiões metropolitanas; o que exclui a possibilidade de criação da RM do Rio de Janeiro, justamente uma daquelas que mais problemas comuns apresenta”.

Destacava o documento que “da análise dos projetos em tramitação na Câmara Federal, constata-se a necessidade urgente de uma lei de caráter normativo que defina os requisitos mínimos para a criação de regiões metropolitanas e as características básicas de sua institucionalização” (Ipea, 1971, p. 144). Segundo Matos (1982, p. 94), até 1973 mais três projetos foram alvo de discussão no Congresso Nacional, contudo, “embora nada tenha resultado destas iniciativas, serviram para mostrar que o assunto não era alheio aos interesses do Poder Legislativo. Foi somente depois de trabalho desenvolvido no Ministério da Justiça, pela sua Comissão de Estudos Legislativos, que a matéria ganhou impulso e proporcionou os debates que se prolongariam até 1973”.

Partiu do Ministério da Justiça então a iniciativa de regulamentação do artigo 157, § 10 da Constituição Federal de 1967, que se consubstanciou no anteprojeto de lei complementar de organização de RMs, publicado no Diário Oficial, seção I, parte I, de 13 de setembro de 1967, folha 9.339, para receber sugestões visando ao seu aperfeiçoamento. O anteprojeto continha dez artigos, nos quais disciplinava a criação de RMs – iniciativa da União, no caso de interesse nacional, ou por solicitação dos estados e municípios interessados, mas sempre por decreto federal –; sua organização – Conselho Metropolitano e Diretoria Executiva – e a competência e a receita da entidade metropolitana. O anteprojeto foi alvo de divergência entre o Ministério da Justiça e o Ministério do Planejamento no tocante à organização, sobre a qual, de acordo com Horta (1975), o primeiro seria favorável a uma legislação específica para cada caso, enquanto o segundo preconizava uma legislação geral, nos moldes do anteprojeto que contou com seu patrocínio.

Nessa fase de indefinição governamental surgiram iniciativas no Congresso Nacional que também não concluíram sua elaboração legislativa, como o projeto de lei complementar federal n. 51, de 1971 (Diário do Congresso Nacional, seção II, 18 de setembro de 1971, folha 4.751), dispondo sobre a organização de RMs, dentro das estruturas das normas gerais do anteprojeto ministerial, e do projeto de lei complementar n. 53-A, de 1968, instituindo a Grande Região Metropolitana de Montes Claros. Neste último, seguindo a orientação atribuída ao Ministério do Planejamento, criava-se a RM específica – aglutinando 27 municípios, numa superfície de 71.318 km e com a população de 685.353 habitantes, para constituir, na época, a “Grande Região Metropolitana de Montes Claros” (Diário do Congresso Nacional, seção I, 9 de junho de 1970, folha 2.085). Enquanto não havia uma definição, os governantes e os técnicos procuravam influir na adoção de soluções que defendiam em seminários, congressos e encontros. São Paulo era então o centro dos debates, onde ocorreram o já citado Simpósio sobre Regiões Metropolitanas, organizado pelo Serfhau, em 1967, o Seminário Internacional sobre Planejamento Metropolitano, realizado em 1972, e a Semana de Debates sobre a Institucionalização das Áreas Metropolitanas, promovida pelo Instituto de Engenharia, com apoio do Serfhau, Cogep, Gegran e da Câmara Municipal, em 1972. Horácio Ortiz, então vereador, relatou sobre o Seminário na Câmara Municipal de São Paulo, citando que estiveram presentes 35 especialistas, sendo nove de São Paulo e os demais de outros estados e países, discutindo métodos e sistemas de planejamento.

De acordo com Horta (1975), nesses eventos fixou-se a posição de preservação da autonomia municipal, insistindo na atividade normativa e não executiva dos órgãos das RMs, para impugnar sua institucionalização como entidade política ou político-administrativa, acima dos municípios e subtraindo-lhes a autonomia naquilo que é de seu peculiar interesse. Defendia-se a necessidade de fixar o conceito de “peculiar interesse metropolitano”, distinto de “peculiar interesse municipal”. O primeiro, concentrado na realização de serviços comuns dos municípios da mesma comunidade socioeconômica, e o segundo na administração própria, de acordo com o peculiar interesse local. Ainda segundo o autor, durante o I Encontro de Prefeitos das Capitais ‒ realizado em um município do interior, Garanhuns (PE) ‒ houve disputa entre técnicos do Banco Nacional de Habitação (BNH), sustentando a necessidade de um governo metropolitano fortemente centralizado – o que suscitou a alusão à figura do superprefeito –, e os autonomistas, defendendo os municípios e as administrações municipais. De acordo com a revista Veja (1973, p. 54), a posição do BNH de criar tal entidade pareceu “tão assustadora quanto abstrata: o superprefeito, nova ameaça aos poderes ainda nas mãos dos administradores municipais”. A posição vencedora colocava a RM como dispensadora de serviços comuns para os municípios da mesma comunidade socioeconômica, e a autarquia metropolitana, criada pela lei estadual, se tornaria o instrumento de realização dos serviços públicos regionais, finalidade constitucional da RM.

Resultou desses debates o I Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social 1972-1974, aprovado pela lei n. 5727 de 1971, que incluía como atuação nacional para o período a “realização de estratégia regional para efetivar a integração nacional”, que previa a consolidação do núcleo desenvolvido do Centro-Sul “até com a criação de regiões metropolitanas”. Francisconi e Souza (1976) destacam que, mesmo durante o debate que antecedeu a delimitação das RMs, havia aqueles que defendiam a necessidade de diferentes arranjos. Existia a tentativa de adequar e promover a rede urbana, na qual destacam a Política de Desenvolvimento Urbano do Paraná (PDU), elaborada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), em convênio com o governo do estado, Sudesul e Serfhau, que avançava nesse sentido.

No documento do Ipea (1971) afirma-se que os principais pontos do anteprojeto resultaram do simpósio do Serfhau em 1967, sobretudo a forma legislativa que deveria ser adotada para a criação das RMs. Tiveram de optar ou por “uma lei complementar específica para cada região metropolitana a ser instituída, ou pela elaboração de uma norma geral que disciplinasse o reconhecimento e a instituição das referidas áreas” (Ipea, 1971, p. 7). Recomendaram elaborar norma geral que fixasse as diretrizes para a instituição de RMs, incorporada ao anteprojeto elaborado pelo Ministério da Justiça, que determinava como RM aquelas que obedecessem a todos esses requisitos: território compreendido em mais de uma entidade político-administrativa; importância econômica e social macrorregional; predominância de setores de atividades econômicas secundárias e terciárias; centro de cultura e de serviços de apoio financeiro de macrorregiões; continuidade urbana; mobilidade populacional permanente dentro da área; e serviços públicos e de infraestrutura de interesse comum ou necessidade do seu estabelecimento.

O Ipea chegou às seguintes considerações sobre o anteprojeto: os requisitos não eram precisos (a importância econômica e social macrorregional da área ou a importância da metrópole como centro cultural e de apoio financeiro), por outro lado, qualquer cidade acima de um determinado contingente populacional tem predominância das atividades terciárias; a existência de descontinuidade nas construções diferia de integração metropolitana; quanto à mobilidade, o tipo peculiar ao fenômeno metropolitano define-se pela presença de fluxos diários de trabalhadores; no § 2° do artigo 1, definir os serviços, os mais comuns, quais ficariam a cargo da entidade metropolitana, a ordem de prioridade de seu atendimento; e quanto à competência da entidade metropolitana, deveria ser evitado o excessivo detalhamento de atribuições, fixando apenas as mais genéricas.

Lei complementar n. 14/1973: estabelecimento das RMs brasileiras

De acordo com Matos (1982), com as modificações originadas da análise do Ipea, foi elaborado um novo anteprojeto. As discussões continuaram tanto no âmbito do Executivo, do Legislativo, bem como nos meios técnicos, dentro e fora do governo. Finalmente, em 1973, o Executivo federal enviou ao Congresso Nacional o anteprojeto, que em quase nada se assemelhava aos anteriores. Incluindo cinco emendas das 42, tornou-se a lei complementar n. 14, de 1973. O autor apresenta as emendas que propunham a criação de novas RMs (p. 98): emenda 1, que propunha a criação da RM do Rio de Janeiro, integrada pela cidade do Rio de Janeiro (ou cidade-estado da Guanabara), Nova Iguaçu, São João de Meriti, Duque de Caxias, Nilópolis, Itaguaí, Mangaratiba, Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Magé, Maricá e Rio Bonito; emendas 2 e 16, que propunham a criação da RM de Vitória; emenda 3, que indicava a criação das RMs de Niterói e Nova Iguaçu; emendas 4 e 17, que criavam a RM de Florianópolis; e emenda 5, que criava a RM de Santos. Nenhuma dessas emendas foi acatada. Incluíram-se então as seguintes: emenda 11, acrescentava municípios à RM de Recife; emendas 12 e 13, acrescentavam municípios à região de Curitiba; emenda 15, excluía o município de Igarapé da RM de Belo Horizonte; e emenda 18, estabelecia que o salário-mínimo dos municípios das RMs fosse igual ao da capital do estado a que pertencessem.

Diferente dos anteprojetos sugeridos anteriormente, a lei complementar criou, de uma só vez, as oito RMs e definiu os municípios integrantes. Estabeleceu ainda que cada região teria um conselho deliberativo e um consultivo (que sequer apareciam nas propostas anteriores), indicando sua composição e funções, e definiu os serviços de interesse comum. A resolução para obrigar os municípios a participarem da execução do planejamento metropolitano integrado, sem ferir sua autonomia, está no artigo 6º da lei complementar federal n. 14/1973: “Artigo 6º ‒ Os municípios da região metropolitana que participarem da execução do planejamento integrado e dos serviços comuns terão preferência na obtenção de recursos federais e estaduais, inclusive sob a forma de financiamentos, bem como de garantias para empréstimos”. Vinculou ainda a destinação de recursos federais à confecção de planos integrados de tais RMs, por meio do decreto federal n. 72.800, de 1973, restringindo o acesso a recursos para infraestrutura urbana por projetos compatíveis com os planos formulados para a região, ao contrário do que afirma Villaça (1999), para quem a regra não existia. Existindo, não foi aplicada, contudo.

Também o decreto federal n. 73.600, de 1974, definiu um mínimo de 5% dos recursos do Fundo de Participação dos Estados para o financiamento dos projetos comuns. Ou seja, caracterizava a lei a forma administrativa e financeira que o governo central definiu para agir sobre tais espaços, oportunizando aos municípios integrados a possibilidade de realização de ações que se sobrepusessem aos limites territoriais. Portanto, todas as responsabilidades, com exceção da delimitação e do financiamento, foram transferidas aos governos estaduais. Não havendo na lei instrumentos para sua efetiva aplicação, os estados passaram a organizar entidades de planejamento e administração metropolitana dentro das diretrizes da lei complementar (Matos, 1982), que passariam a caracterizar o planejamento metropolitano após 1973. Alves (1979) destaca que até então as formas institucionais básicas adotadas nos diferentes países consistiam em: criação de um ente político-administrativo autônomo sem eliminar os entes locais; fusão dos municípios; criação de unidades metropolitanas setorizadas, com autonomia administrativa e financeira; cooperação voluntária entre os municípios da mesma região por meio de convênios; e atribuição legal da responsabilidade de decisão a respeito dos problemas metropolitanos à esfera governamental intermediária (o estado-membro, em nosso caso), acima dos municípios e abaixo do poder central, objetivando a unificação e a coordenação dos órgãos e entidades executivas dos programas metropolitanos.

A última forma não exclui a participação dos outros entes governamentais envolvidos e foi adotada no Brasil, sendo o modelo que lhe empresta o fundamento de concepção, para Alves (1979), o que melhor se adaptava a nossa forma federativa de Estado, visto integrar-se nos modelos do federalismo de cooperação, sem ofensa ao princípio da autonomia política. O referido modelo não foi integralmente aplicado, quer pela não participação da União na administração básica das RMs, na qual não tem representação, quer pela fraca representatividade dos municípios. Azevedo (1967, p. 16) destaca que “a União estabeleceu não a ‘região metropolitana’, mas a possibilidade de um governo específico para a região metropolitana”, sendo que o problema é que, verticalmente, ela é influenciada pelos três entes federativos, já que não constitui por si um ente, e horizontalmente, por uma infinidade de municípios, dificultando a possibilidade de uma administração unificada.

A promulgação da lei complementar federal n. 14, de 8 de junho de 1973, veio encerrar essa fase de indefinição. Harmonizou as duas tendências que foram identificadas em posições anteriores do Ministério da Justiça e do então Ministério do Planejamento. Foram criadas oito RMs (Figura 3), especificadas no texto, e, ao mesmo tempo, as normas gerais de organização. Explicitou os serviços comuns de interesse metropolitano, enfrentando a questão central da RM, oferecendo solução diversificada para a unificação de execução, e autorizando a concessão à entidade estadual, constituição de empresa de âmbito metropolitano ou estabelecida por convênio (artigo 3º, parágrafo único). O artigo 5º da lei n. 14/1973 determina os serviços comuns metropolitanos: planejamento integrado de desenvolvimento econômico e social; saneamento básico, notadamente abastecimento da água e rede de esgotos e serviço de limpeza pública; uso do solo urbano; transportes e sistema viário; produção e distribuição de gás combustível canalizado; aproveitamento de recursos hídricos e controle da poluição ambiental, na forma que dispuser a lei federal; e outros serviços incluídos na área de competência do conselho deliberativo por lei federal.

Para Andrade e Santos (1987, p. 95), as opções quanto à definição dos serviços e à forma de financiamento que justificavam economicamente a institucionalização de RMs eram rendimentos crescentes de escala (hipótese de que o custo médio para a realização dos serviços seria reduzido em grande escala); indivisibilidade dos investimentos: a escala metropolitana poderia garantir valores sustentáveis para pagamentos de infraestruturas que, em nível municipal, seriam impraticáveis; polarização das metrópoles: o interesse metropolitano poderia enfraquecer o domínio dos municípios polos, com os quais os demais não têm condições de concorrer, promovendo maior igualdade de distribuição dos investimentos públicos; descentralização industrial: os municípios periféricos não possuem infraestrutura adequada para empreendimentos industriais, que acabam optando por se instalar no polo (essa hipótese deixa de valer na década de 1990). Ainda que as concentrações gerem economias e deseconomias de escala, elas são absorvidas de formas diferentes pelas classes sociais e pelos municípios. Ao propiciar melhor qualidade e quantidade de serviços nos municípios periféricos, combinadas com vantagens locacionais, poderia ocorrer maior descentralização da indústria.

Para Grau (1972), a observação da disposição permite algumas conclusões a seu respeito: instituiu uma modalidade de relacionamento originário e subsistentemente compulsório entre as unidades político-administrativas integrantes das RMs; o estabelecimento dependia, para se efetivar, de lei complementar que a instituísse; as RMs constituíam unidades territoriais integradas por mais de um município, independentemente de suas vinculações administrativas, desde que fizessem parte de uma mesma comunidade socioeconômica; o objetivo do seu estabelecimento estava limitado à realização de serviços comuns, podendo a entidade a ser criada, em consequência àquele estabelecimento, não apenas promover a execução de serviços comuns, integrada e coordenadamente, mas também executá-los diretamente; a disposição constitucional não permitia a criação de um quarto nível político-administrativo, respeitando a autonomia municipal; e não há impedimento à participação de outras unidades político-administrativas que não os municípios – a União e os estados – na entidade administrativa responsável pela execução dos objetivos metropolitanos (Grau, 1972, p. 64-65).


Figura 3 – RMs definidas em 1973 e 1974. Elaborada pelo autor4


Gouvêa (2005, p. 134) afirma que, apesar das críticas, o arranjo implantado pela ditadura militar apresentava características interessantes. Não criou um quarto nível de poder, mas se preocupou em particularizar serviços configurados como de interesse comum e em formalizar as atividades a serem desempenhadas no âmbito metropolitano, ou seja, planejamento, promoção e coordenação da execução de programas e projetos de interesse plurimunicipal. Exceto quanto à existência dos conselhos, a organização e a especificação das estruturas institucionais para efeito de operacionalização das políticas foram deixadas para cada estado. O Conselho Deliberativo seria o órgão de planejamento, coordenação, execução e unificação dos serviços comuns, enquanto o Conselho Consultivo seria opinativo e de aconselhamento, para questões de interesse da RM. As soluções para problemas que envolviam um grande número de agentes deveriam se desenvolver segundo as peculiaridades de cada RM.

Percebe-se, como Deák (2004) afirma, que o período que se estende de meados da década de 1960 até 1973 constituiu a “era de ouro” do planejamento no Brasil. Para o autor, até esse momento a prática de planejamento restringia-se às investidas de poucas municipalidades, sem qualquer coordenação, integração ou subordinação a uma política federal de regulação urbana. A partir de 1964, essa política nacional passou a ser realizada, sendo o fio condutor das instituições voltadas ao planejamento a concepção de que ele é função de governo, técnica e forma de administração. Reproduziam, dessa forma, um marco institucional em nível federal que possibilitou e condicionou a criação de instituições de planejamento nas diferentes escalas e arranjos e que permanece dominante no planejamento metropolitano brasileiro. Definido o que seriam as RMs no Brasil, houve o debate sobre a delimitação territorial dessas unidades de planejamento. Entre os ministérios, havia propostas oriundas do Ministério do Interior (por meio do Serfhau), do Ministério do Planejamento (IBGE e Ipea) e do Ministério da Justiça (comissão de juristas), além do BNH, das universidades e de organismos públicos de alguns estados. Também o Senado e a Câmara Federal discutiam tal tema.

O estudo para fins de ação administrativa realizado pelo IBGE, publicado em 1971, teve como base os textos de Galvão et al. (1969) e de Davidovich (1971), ambas técnicas da instituição. Denominado “Divisão do Brasil em regiões funcionais urbanas”, resultou de uma revisão e reelaboração do “Estudo preliminar da divisão do Brasil em espaços polarizados”, publicado em 1967 pelo mesmo instituto. Nele, foram identificados e definidos quatro níveis para os 718 centros urbanos do Brasil, hierarquizados de acordo com sua dominância e subordinação na rede urbana. Em primeiro, estavam os centros metropolitanos, seguidos dos centros regionais, centros sub-regionais e, por fim, os centros locais. O modelo resultante deveria servir tanto a “uma política regionalizada do desenvolvimento como para orientar a racionalização no suprimento dos serviços de infraestrutura urbana através da distribuição espacial mais adequada” (IBGE, 1972, p. 2), aperfeiçoando a máquina administrativa e eliminando a centralização executiva. Essa série de publicações indica que as questões relacionadas às áreas de influência, redes urbanas, relações cidade-região, áreas metropolitanas e correlatos estavam entre os temas de pesquisa prioritária no Departamento de Geografia do IBGE naquele momento. O modelo definido para o estudo estava de acordo com o conceito proposto por Haggett e Chorley (1967), em Socio-economic models in geography, que se baseava na contagem de relacionamentos ou vínculos mantidos entre os centros urbanos em três setores de afinidades: fluxos agrícolas, distribuição de bens e serviços, economia e população. No estudo se considerou a cidade não apenas como forma, mas também como estrutura, havendo necessidade de existir uma economia básica urbana que estabelecesse vínculos entre cidades e suas regiões. A economia urbana básica estrutura a cidade, enquanto fluxos e relacionamentos organizam a região funcional urbana. Esse modelo pressupõe a hipótese de que cidades e fluxos têm capacidade para estruturar de maneira específica o espaço. Vínculos e relacionamento se ampliariam em intensidade e frequência, dependendo das distâncias, da divisão funcional e da distribuição de renda das cidades e das regiões. Os indicadores para exprimir esses relacionamentos, para os autores, poderiam ser obtidos de duas maneiras: pela rede viária e fluxo de passageiros ‒ estudos como os de Berry e Garrison (1968) definiam que quanto mais importante o centro, maior o afluxo de estradas, veículos e pessoas; e por pesquisa direta, estabelecendo o sistema de relações entre os centros urbanos, com levantamento dos locais de distribuição de bens e consumos.

O estudo se baseou no segundo modelo, tendo como fonte questionários preenchidos pelos agentes municipais de estatísticas do IBGE em 1966, que incluía também os fluxos agrícolas. Tratou-se de uma pesquisa qualitativa, portanto, não foram quantificadas as relações indicadas, sendo bastante gerais, por limitação do próprio instituto de, naquele momento, empreender e organizar a quantidade de dados para um país da dimensão territorial do Brasil.

Seguindo as orientações do britânico J. Cole (que trabalhava no IBGE nos anos 1960), procedeu-se ao somatório das ligações organizadas em uma matriz de dados. Cada município foi representado em linhas e colunas, que identificariam quem eram e com quem se relacionavam, respectivamente. As relações podiam ser agrícolas, de distribuição de bens e serviços e de prestação de serviços. Somavam então pontos de acordo com os vínculos que mantinham nesses três setores. Alguns problemas indicados pelos autores foi a generalização dos serviços e bens, como se todos tivessem a mesma importância, bem como da relação direta de compra ou intermediária (quando o item não foi produzido, mas era comercializado – caso dos grandes produtores de sapatos, por exemplo). Outro problema era a hipertrofia urbana de alguns municípios como Belém, que, ainda que inferior a São Paulo, polarizava uma área cerca de três vezes maior. Por isso afirmavam ser um quadro geral, naquele momento considerado como satisfatório. Dialogando com o estudo “Região de influência de cidades” (Regic), publicado em 1967, destacavam o papel de Goiânia (GO), que naquele momento polarizava Brasília, como um município que tinha mais relacionamentos em número absoluto do que outros já tidos como metropolitanos, como Curitiba e Belém. Consideraram Goiânia, portanto, como a décima metrópole, unindo-se às nove anteriores definidas pelo IBGE. Os centros urbanos foram então divididos em quatro níveis, como já dito, sendo o segundo, o terceiro e o quarto subdivididos em dois subníveis cada. Além dos critérios de relacionamentos e vínculos já citados, levou-se em consideração também a população em 1970, o número de relacionamentos de âmbito nacional e regional, o número de centros subordinados e a nota de equipamentos funcionais (de acordo com a pesquisa “Centralidade: subsídios à regionalização”, publicada em 1968). Ainda que o texto não cite o fato, é notável que apenas capitais de estados estavam no nível 1, que foi dividido em: 1a) Grande metrópole nacional: São Paulo; 1b) Metrópole nacional: Rio de Janeiro; 1c) Centros metropolitanos regionais: Recife, Belo Horizonte, Salvador e Porto Alegre; e 1d) Centros macrorregionais: Curitiba, Fortaleza, Belém e Goiânia.

Como principais resultados, os autores apontavam a grande diferença entre Rio de Janeiro e São Paulo no cenário nacional, sendo que esta capital tinha amplitude metropolitana e regional muito superior àquela. Um dos motivos apontados para tal diferenciação era o grande desenvolvimento pelo qual passava a capital de Minas Gerais, que, ao reforçar sua posição no estado, limitava a polarização até então exercida pelo Rio de Janeiro. Havia, portanto, a tendência da hierarquia urbana do Brasil ter apenas uma metrópole nacional à frente, que se mantém, como demonstrou o Regic de 2018. Outro resultado verificado foi que as desigualdades regionais se refletem nas diferenciações da organização estrutural das redes urbanas. Por fim, o dinamismo demográfico dos centros regionais importantes nível 2a, como Campinas (SP) e Campina Grande (PB) que, somadas a Goiânia, representavam 47,8% da população urbana em 1970, tendo em geral incremento populacional de cerca de 50% entre 1960 e 1970. Na tentativa de delimitar as RMs no Brasil, os autores dividiram-se entre os que tomaram como base critérios quantitativos e aqueles que buscaram definir qualitativamente o fenômeno. Matos (1982) destaca como principais contribuições as elaboradas pelo IBGE, Ministério da Justiça, Ministério do Interior, Ministério do Planejamento e Coordenação Geral e por Soares (1969), que constam no Quadro 1:

Quadro 1 – Principais contribuições à delimitação das RMs em 1973


Fonte: Galvão et al. (1969); IBGE (1967, 1968, 1972); Soares (1969). Elaborado pelo autor


Pode-se observar que, se tomados os critérios de Galvão et al. (1969), ocorreriam modificações, como a exclusão da RM de Belo Horizonte dos municípios de Igarapé, Mendes e Engenheiro Paulo de Frontin, bem como, se considerados os critérios dos ministérios, Curitiba e Belém não seriam definidas como RMs. Além dessas, houve propostas como as de Aliomar Baleeiro Filho (de criação de áreas metropolitanas de nível médio ‒ polos regionais ‒ subordinadas às RMs); de Lysia Bernardes (para quem haveria dois tipos de áreas metropolitanas: as estruturadas em torno de metrópoles e as com um núcleo central que não se qualifica como metrópole); de Rodrigo Mayo, para quem seria o “sistema espacial composto de área metropolitana, diferentes centros secundários, zona rural e um conjunto de eixos de comunicação unindo-os, tanto entre si quanto com as áreas metropolitanas”, distinguindo região e área metropolitana, sem qualificá-las (Matos, 1982). Boisier (1972), com base nas características funcionais das RMs e delas como um subsistema do sistema inter-regional, define metrópole (cidade excepcionalmente grande em relação ao meio geográfico e socioeconômico em que se insere), área metropolitana (aglomerado constituído pelo núcleo central metropolitano e os centros urbanos incorporados a ele mediante processo de suburbanização, inclui os espaços rurais contíguos) e RM (área metropolitana, periferia metropolitana, por centros metropolitanos e por um conjunto de eixos de comunicação e desenvolvimento unindo os centros e a área). Por fim, foi mantido até 1988 as nove RMs, sendo que apenas a RM de Fortaleza sofreu alteração, com a inclusão de Maracanaú (lei complementar federal n. 52, de 1986), emancipado de Maranguape, sem ampliação, portanto, de sua área.

Considerações finais

Conclui-se que as RMs são espaços que se configuram como “um acúmulo desigual de tempo” (Santos, 1976, p. 21), pois, como afirmou Joe Painter, “é [um espaço] necessariamente poroso, histórico, variante, desigual e perecível” (2010, p. 1094). Entretanto, é importante ter em mente que, apesar dos esforços em delimitar e moldar esse espaço, ele “nunca está completo, mas sempre se tornando”.

Noventa anos depois, continua necessário o enfrentamento dos obstáculos que se colocam para a institucionalização das RMs como espaços políticos, capazes de mobilizar Estado, mercado e sociedade para a resolução dos problemas pertinentes a essa escala. Se isso não ocorrer, estaremos fadados ao comprometimento dos arranjos institucionais de planejamento em sua capacidade de ação, limitados por iniciativas fragmentadas, persistindo a ideia de espaços preferenciais para acumulação de capital e exercício da dominação, inclusive se instituindo espaços que não se configuram enquanto RMs. Evitando, assim, o identificado por Lacerda e Ribeiro (2014, p. 192), que afirmam que “apesar dos esforços técnicos em criar, nos organogramas institucionais, conselhos e outros instrumentos de cooperação, a gestão metropolitana, no caso brasileiro, ainda sobrevive no bojo da fragmentação do território e de poucas experiências exitosas”.

A importância do resgate do debate sobre a formação das RMs permite a recuperação da formação dos aparatos de planejamento e arranjos territoriais em diferentes escalas, apontando as formas alternativas de articulação territorial urbana que podem dar conta da complexidade do fenômeno metropolitano.

Nesse sentido, um dos fatores que não permitiu a simples transposição das experiências administrativas procedidas no exterior para aplicação às realidades metropolitanas brasileiras foi a circunstância de que os governos locais não são entidades delegadas aos estados. Os municípios brasileiros possuem autonomia jurídica, não sendo, assim, os estados que determinam, por meio de disposições legais ou atos administrativos – como ocorre em outros sistemas de governo de organização federativa ‒ as suas normas de conduta, a organização dos seus serviços públicos e a sua política de execução. A integração deles na federação e seu caráter político-administrativo não se manifestam nas demais federações, onde eles são circunscrições territoriais administrativas (Grau, 1972, p. 36).

O escopo definido para o desenho institucional que as regiões metropolitanas possuem no Brasil sempre esteve em descompasso com o que poderia ser feito, na existência de modelos mais flexíveis que se adaptassem aos diferentes contextos de um país de dimensões continentais. No período analisado, a delimitação das RMs criou uma política hierarquizada, de cima para baixo, uma forma de controle e intervenção do poder central sobre os locais mais dinâmicos do território. Por outro lado, se a ação regional em uma unidade caracterizada pela continuidade espacial e pela integração dos municípios é difícil, as novas escalas e fenômenos que se acercam tendem a complexificá-las ainda mais.

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Recebido em 29/8/2022

Aprovado em 9/2/2023


Notas

1    Observa-se que a única RM definida em 1973-1974 que não aparece como polo de uma região foi Curitiba. Por outro lado, incluiu-se São Luís (MA).

2    As RMs definidas por leis no Brasil também aparecem no estudo da Universidade da Califórnia. As que não foram reconhecidas pelas leis brasileiras são: Campinas, Santos, Juiz de Fora, Maceió, João Pessoa, Natal e São Luís.

3    Que incluía os municípios de Alvorada, Canoas, Esteio, Gravataí, Guaíba, Novo Hamburgo, Porto Alegre, Sapucaia do Sul, São Leopoldo e Viamão.

4    Além das oito definidas pela lei complementar federal n. 14/1973, a RM do Rio de Janeiro foi definida pela lei complementar federal n. 20/1974.



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