Acervo, Rio de Janeiro, v. 37, n. 1, jan./abr. 2024

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“Preserve a memória das artes cênicas”

Projetos e políticas para a memória das artes cênicas no Brasil (1974-1990)

“Preserve the performing art’s memory”: projects and policies for performing art’s memory in Brazil (1974-1990) / “Preservar la memoria de las artes escénicas”: proyectos y políticas para la memoria de las artes escénicas en Brasil (1974-1990)

Caroline Cantanhede Lopes

Doutora em História pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Documentalista da Fundação Nacional de Artes (Funarte), Brasil.

caroline.cantanhede@gmail.com

Resumo

Neste artigo, analisamos como a memória foi estrategicamente mobilizada durante a reformulação do Serviço Nacional do Teatro (SNT), iniciada em 1974, quando a ditadura incorporou a cultura em sua agenda política. Também abordamos a importância da continuidade do Projeto Memória e da Campanha de Doação para a implantação do Centro de Estudos Nacional de Artes Cênicas (Cenacen), em 1982. Por fim, avaliamos as circunstâncias do fim da campanha (1990).

Palavras-chave: memória das artes cênicas; política cultural; Projeto Memória; Campanha de Doação.

Abstract

In this article, we analyze how the memory was strategically mobilized during the reformulation of the Serviço Nacional de Teatro (SNT) in 1974, when the dictatorship incorporated culture into its political agenda. We also addressed the importance of the continuity of the Projeto Memória and the Campanha de Doação for the implementation of the Centro de Estudos Nacional de Artes Cênicas (Cenacen) in 1982. Finally, we evaluate the circumstances of the end of the Campanha (1990).

Keywords: memory of the performing arts; cultural policy; Projeto Memória; Campanha de Doação.

Resumen

En este artículo, analizamos cómo la memoria se movilizó estratégicamente durante la reformulación del Serviço Nacional de Teatro (SNT) en 1974, cuando la dictadura incorporó la cultura a su agenda política. También abordamos la importancia de la continuidad del Projeto Memória y la Campanha de Doação para la implementación del Centro de Estudos Nacional de Artes Cênicas (Cenacen) en 1982. Finalmente, evaluamos las circunstancias del final de la Campanha (1990).

Palabras clave: memoria de las artes escénicas; política cultural; Projeto Memória; Campanha de Doação.

Introdução

A estruturação de uma política nacional para a cultura proporcionou o incremento das atividades patrimoniais no Serviço Nacional de Teatro (SNT)1 ao longo da década de 1970. Antes, observamos apenas algumas iniciativas pontuais capitaneadas por esforços individuais de gestores e funcionários, as quais careciam de estrutura e continuidade. Como exemplo, podemos citar a criação de um museu dentro da estrutura no SNT, em 1958, que não chegou a funcionar efetivamente ao longo de quase 18 anos de existência (Lopes, 2020).

Uma vez dotada de centralidade, a memória do teatro – e, posteriormente, das demais artes cênicas (dança, ópera, circo) – passou a figurar como peça-chave na estratégia de ressignificação institucional implementada pela gestão de Orlando Miranda, iniciada em 1974. E o vasto acervo que se formou como resultado dessas ações, atualmente sob a guarda do Centro de Documentação da Fundação Nacional de Artes2 (Cedoc/Funarte), reflete esse contexto de intensos debates dedicados à dinamização do extinto órgão.

Das ideias e projetos colocados em prática, destacamos dois neste artigo: o Projeto Memória do Teatro, de 1976, e a Campanha de Doação, lançada em 1978. Ambos contribuíram diretamente para a implementação de uma política de preservação da memória das artes da cena, ao mesmo tempo em que fundamentaram o escopo de reestruturação do SNT, cuja culminância consistiu na criação do Centro de Estudos Nacional em Artes Cênicas (Cenacen), já na então instituição sucessora, o Instituto Nacional de Artes Cênicas (Inacen), criado em 1981.

Tais transformações resultaram das inúmeras críticas do próprio setor a respeito da reduzida atuação do SNT. Sua presença foi, ao longo dos anos, bastante limitada no território brasileiro. Para equacionar tal descompasso, Orlando Miranda foi alçado ao posto de diretor, chancelado por uma parte da classe teatral, num contexto em que suas propostas se coadunaram às do então regime em vigor.

Nosso objetivo consiste em compreender de que maneira a valorização da memória e a constituição de um extenso patrimônio documental se relacionam com o processo de reforma institucional desencadeado no SNT a partir de 1974 e que somente foi interrompido em 1990. Nesse sentido, estamos de acordo com as reflexões de Santos (2002) sobre o conceito de memória. Após analisar diversas correntes teóricas, a autora propõe que “o trabalho de [Walter] Benjamim, ao tentar compreender memória como a experiência de indivíduos no tempo e espaço” (p. 145), possibilita a constatação de que existem diferentes maneiras de nos relacionarmos com o mundo – positivas ou negativas –, conforme o contexto de cada época. Desse modo, seria possível “passar de uma reflexão abstrata de memória para uma que se baseie em condições históricas específicas” (p. 146). E essa será nossa perspectiva ao levantarmos algumas ações encampadas pelo SNT para a preservação da memória, as quais ansiavam a promoção de uma recordação “integral” do passado do teatro brasileiro, enquanto elas próprias estavam circunscritas em um dado tempo e espaço.

Este artigo pretende, ainda, divulgar o vasto e único acervo custodiado pela Fundação Nacional de Artes (Funarte), entidade sucessora do extinto SNT, ainda pouco conhecido pela sociedade de uma maneira geral, inclusive entre as demais instituições de memória. Acreditamos que a trajetória atribulada da entidade, pontuada por extinções e pelas descontinuidades que caracterizam o setor cultural brasileiro, contribuiu diretamente para essa situação.

Atualmente sob responsabilidade do seu Centro de Documentação (Cedoc), este patrimônio documental finalmente vem ganhando maior notoriedade: no final de 2022, o Arquivo Oduvaldo Vianna, cuja aquisição se deu via Campanha de Doação, em 1987, recebeu o registro Memória do Mundo da Unesco pelo Comitê Regional da América Latina e Caribe.3 Já em 2023, foi iniciada a transferência do Cedoc para sua nova sede (o prédio do antigo Museu Casa da Moeda, no centro do Rio de Janeiro). Também partiu do Cedoc a iniciativa de mapeamento de acervos de artes por todo o Brasil, a fim de estabelecer subsídios para a construção de políticas públicas para a preservação e difusão de tais conjuntos documentais.4

Todos esses acontecimentos ajudaram a ampliar o alcance da existência desse acervo, muitas vezes eclipsado por pertencer a uma instituição cuja principal atividade-fim é o fomento, como a Funarte. Porém, a preservação da memória das artes brasileiras vem alcançando um protagonismo cada vez maior dentre as políticas engendradas pela fundação. Por isso, consideramos o momento propício para pensar sobre as diferentes estratégias já implementadas nessa área ao longo de sua atividade (inclusive de suas antecessoras, como abordaremos a seguir).

Uma política para o teatro: a gestão de Orlando Miranda no SNT

O Serviço Nacional de Teatro foi criado em 1937 e, tão logo entrou em funcionamento, foi alvo de inúmeras críticas. Desde fins do Estado Novo, havia um descontentamento generalizado a respeito da ação desse órgão de teatro, especialmente sua política de subvenção a grupos amadores e companhias profissionais, em detrimento de construir/reformar teatros, de conceder isenção de impostos, de incentivar a formação de público através do teatro infantil, de estimular a produção dramatúrgica e de publicar peças estrangeiras e nacionais. De acordo com os descontentes, ao não privilegiar essas questões consideradas estruturais, a atuação do SNT era meramente paliativa (Camargo, 2013).

Tais queixas, em maior ou menor medida, perduraram por anos, sem que uma reformulação efetiva fosse realizada no SNT. Esse panorama somente começou a mudar com maior consistência quando o governo federal incorporou a cultura à sua agenda política, em meados de 1970, e iniciou uma reordenação em sua própria estrutura administrativa dedicada à área. O regime militar então em vigor, desde 1964, implementou uma política sistemática de perseguição a diversos setores culturais ligados a movimentos considerados de esquerda ou que apresentassem qualquer conteúdo “subversivo”, principalmente após a promulgação do ato institucional n. 5 (AI-5), em 1968. Na década seguinte, no entanto, foram delineadas novas estratégias, para além da violência e da censura, tendo em vista um projeto modernizador para os setores da cultura e da comunicação, “atuando diretamente por meio do Estado ou incentivando o desenvolvimento capitalista privado” (Ridenti, 2005, p. 98).

Paulatinamente, a cultura assumiu protagonismo nas ações do governo ditatorial, sendo considerada elemento importante para o desenvolvimento da nação, inclusive do ponto de vista econômico. Essa ampliação do ideário desenvolvimentista praticado pela ditadura proporcionou a incorporação do setor cultural em seu projeto nacional. Ao passo que o Estado foi se especializando nos assuntos culturais, verificamos a mesma movimentação nas instâncias e instituições que lhe eram subordinadas.

A fim de atender às demandas que se impunham a partir dessa nova perspectiva, foi iniciada uma readequação do Ministério da Educação e Cultura (MEC), que sequer dispunha, até 1970, de uma instância voltada para a cultura. Desse modo, o Departamento de Assuntos Culturais (DAC)5 foi criado, passando a ser responsável pelas instituições relativas a esse campo (dentre elas, o SNT). Dando prosseguimento ao propósito de promover uma atuação nessa área, que se coadunasse com os princípios do regime, foi lançado, em 1973, o Plano de Ação Cultural (PAC), com vistas à promoção de eventos culturais nas áreas de teatro, música, circo, folclore e cinema (Calabre, 2009).

Assim, após anos de dura repressão, o governo sinalizava com outra estratégia de interlocução junto a artistas e intelectuais, pois o PAC consistiu não só em “uma abertura de crédito, financeiro e político, a algumas áreas da produção cultural praticamente desassistidas pelos demais órgãos oficiais, mas também uma tentativa oficial de ‘degelo’ em relação aos meios artísticos e oficiais” (Miceli, 1984, p. 55).

Como o teatro foi um dos setores contemplados pelo PAC, foi destinada uma verba de 4 milhões de cruzeiros, sob a administração de José Maria B. de Paiva,6 para ser empregada no setor teatral, entre novembro de 1973 e março de 1974 (Mostaço, 2014). A fim de executar a dotação, B. de Paiva, então diretor da Escola de Teatro da Guanabara,7 buscou diálogo com o setor que julgou mais organizado: o empresarial, representado pela Associação Carioca de Empresários Teatrais (Acet).

Desse encontro resultou um documento assinado por Orlando Miranda e pelo dramaturgo e produtor Paulo Pontes, presidente e secretário-geral da Acet, respectivamente (Mostaço, 2014). Seu conteúdo apresentava um panorama geral sobre a precariedade das instalações dos principais teatros brasileiros e explicava como tal situação comprometia a circulação de espetáculos pelo país (Miranda, 2009). Um tema que também foi abordado, transversalmente, foi a censura. Porém, a associação buscou um tom conciliatório em prol da viabilidade econômica das atividades empresariais (Pacheco, 2005).

Percebemos, por sua vez, que o diagnóstico apresentado pelos empresários não se contrapunha à reorganização da esfera cultural já posta em marcha pelo Estado, muito pelo contrário. Tal “afinamento” entre as necessidades do empresariado representado pela Acet e as reformulações da política cultural, aprofundadas pelo período de Ernesto Geisel (1974-1978), culminou na indicação de Orlando Miranda para a direção do Serviço Nacional do Teatro, cujo nome foi encampado por grande parte do setor, em que pesaram sua larga experiência e atuações pregressas na esfera teatral.8

Logo após assumir a direção do SNT, em 1974, Miranda organizou o Plano de Ação Cultural interno, no qual estabeleceu as principais linhas de atuação a serem desenvolvidas no segundo semestre daquele ano. Logo no início do documento, a frase “só poderá entrar em vigor graças à ação do Plano de Ação Cultural e do Departamento de Assuntos Culturais do MEC”9 deixa bem evidente a sintonia entre o MEC e o SNT naquele momento.

Foi iniciada, dessa maneira, a reformulação do SNT, conforme os anseios de uma parcela do setor teatral, em consonância com o governo federal e sua política cultural. O Plano de Ação Cultural elaborado pela nova gestão do órgão pode ser considerado um primeiro instrumento para a sua renovação, mediante a dinamização da produção teatral e a expansão de acesso à cultura; a implantação e/ou dinamização da rede de agentes e de equipamentos para cada um dos setores do teatro; o retorno do concurso de dramaturgia, criado durante a passagem de Bárbara Heliodora pelo SNT (1964-1967) e extinto em 1968; a popularização do ingresso para espetáculos teatrais (Campanha das Kombis, executada pela Acet como um produto do PAC); e a retomada editorial, com a publicação de livros especializados e da revista Dionysos, criada em 1949.

Mesmo que nesse primeiro ato de implementação de mudanças não houvesse uma clara menção à memória, o PAC do SNT anunciava medidas para o seu acervo documental, como a criação do Banco de Peças, no setor da Biblioteca, cuja atribuição consistia em reunir “textos de dramaturgia nacional ou estrangeira, inéditos ou não”.10 Com o intuito de sanar a escassez de publicações dedicadas ao teatro, o Banco de Peças seria composto por edições ou cópias (datilografadas, manuscritas ou de qualquer outro tipo), a fim de promover o acesso a obras dramatúrgicas para fins profissionais ou educativos. O documento também estabeleceu que as fichas para a catalogação desse material deveriam considerar o tema, a situação histórica e social, o gênero, o número de atos e a quantidade de personagens masculinos e femininos,11 com o objetivo de favorecer a localização de textos dramáticos que se adequassem aos interesses dos usuários.

Constatamos, desse modo, que para Orlando Miranda e sua equipe já não havia mais espaço para um modelo preservacionista museal, embora isso ainda não estivesse plenamente enunciado nesse primeiro momento. Por outro lado, é perceptível que a documentação serviu, conceitualmente, como uma ferramenta para otimizar os novos projetos para formação e uso desse acervo então em curso. Em contraposição, o Museu do SNT, criado em 1958, nunca entrara em funcionamento, apesar de ter captado alguns documentos e de ter recebido uma parcela bastante significativa do arquivo pessoal do jornalista Brício de Abreu (Lopes, 2020).

Vale ressaltar que, nesse contexto dos anos de 1970, os centros de documentação foram progressivamente adotados por várias instituições voltadas para a preservação da memória, em todo o país, como o modelo mais eficiente frente às necessidades informacionais emergentes e à multiplicidade de formatos dos documentos (Camargo, 2003), como, por exemplo, as fitas contendo as gravações de outra ação prevista pelo Plano de Ação do SNT: a coleta de depoimentos de profissionais de teatro (atores, dramaturgos, diretores).

Essa iniciativa originou, inclusive, uma linha editorial intitulada Série Depoimentos. Ainda em 1974 foram realizadas entrevistas com Procópio Ferreira, Iracema de Alencar, Nelson Rodrigues, Paschoal Carlos Magno, Tônia Carreiro e Paulo Autran no Rio de Janeiro; e com Décio de Almeida Prado, Abílio Pereira de Almeida, Sadi Cabral e Maria Della Costa em São Paulo. Delineava-se, pela primeira vez na trajetória do SNT, um impulso amplo e diversificado para a preservação da memória do teatro brasileiro.

Toda essa diversificação de atividades pressupunha uma readequação da unidade administrativa dedicada ao acervo do órgão, em processo de diversificação e de redefinição.12 Foi, assim, uma questão de tempo para que o projeto memorialístico de um museu fosse substituído por outra alternativa, cada vez mais voltada para o modelo do centro de documentação, tido como mais eficiente para lidar com toda a diversidade dos “novos” documentos (sonoros, audiovisuais, iconográficos, textuais) gerados pela instituição e pelas novas metodologias adotadas na organização do conhecimento. O Projeto Memória do Teatro, lançado em 1976, pontua essas questões de forma mais clara e direta.

Projeto Memória: uma estrutura aberta

Na esteira dessa reorganização do SNT iniciada por Orlando Miranda, foi lançado o Projeto Memória do Teatro, em 1976. Mais uma vez, observamos uma convergência com a política cultural que estava sendo construída pelo MEC. Nesse mesmo momento, o ministério lançara sua Política Nacional de Cultura (PNC), elaborada em 1975 e divulgada no ano seguinte, além de ter criado um novo modelo de instituição cultural: a Fundação Nacional de Arte (Funarte) .13

A PNC apresenta as diretrizes que passariam a orientar o Estado no campo cultural e evidencia que a cultura, embora com forte cariz regional, se constituiria em um importante elemento para a integração nacional, pois seria “o meio indispensável para fortalecer e consolidar a nacionalidade” (MEC, 1975, p. 9). Uma de suas metas seria “conservar o acervo constituído e manter a memória nacional, assegurando a perenidade da cultura brasileira” (p. 28). O documento estimula, assim, a criação de ações e programas que busquem:

e) valorizar os museus – nacionais, regionais, locais ou especializados – reunindo o que há de mais caracteristicamente expressivo em nossa cultura, através das técnicas, do artesanato, das artes plásticas, do disco, entre outras;

f) incentivar a preservação dos arquivos nacionais, estaduais ou locais, [...] e estimular ao mesmo tempo a conservação de arquivos particulares ou a incorporação dos documentos conservados em famílias aos arquivos oficiais;

g) desenvolver uma campanha de informação e educação, com a utilização de todos os meios possíveis – televisão, rádio, disco, cinema, revista, jornal, folhetos – para a conscientização maior dos nossos bens culturais, a fim de valorizar suas expressões legítimas em todos os níveis da população [...]. (MEC, 1975, p. 37)

No âmbito do SNT, as orientações da PNC foram contempladas pelo Projeto Memória, lançado em 1976, bem como pela Campanha de Doação, implementada em 1978. Desse modo, tais discussões faziam parte da ambiência de ideias sobre redefinições em que o órgão, o ministério e o próprio regime se situavam, conforme podemos entrever no trecho da entrevista de Orlando Miranda em destaque:

O Ney Braga14 sentava de dois em dois, ele juntava todos os órgãos. Biblioteca Nacional, Museu, o Cinema. [...]. Sentava em volta da mesa dele lá em Brasília, começava e cada um fazia um relato do que estava acontecendo [...], todo mundo fazia um relato, então eu sabia de tudo o que acontecia no Ministério da Educação. O outro sabia de tudo. Cada um sabia de tudo [...].15

Conforme o relato do ex-diretor do SNT, existia uma grande interação entre os dirigentes dos diferentes órgãos que compunham o MEC e o ministro. Logo, compreendemos que as discussões que se desenrolavam no ministério encontraram ressonância na direção, como, por exemplo, a elaboração de uma política de preservação da memória. De fato, a memória teatral figura como um dos destaques do Plano de Ação de 1976 do SNT:

Além das medidas imediatas para cada um dos setores, foram previstas outras, indispensáveis à manutenção de uma infraestrutura que permita ao teatro brasileiro uma continuidade de trabalho e um desenvolvimento.

Entre estas, e corroborando a permanente atualização da Biblioteca e do Acervo do SNT, estão as atividades que incluem a difusão do gênero teatral e a formação e aprofundamento gradativos de uma memória capaz de lembrar, permanentemente, as origens e sentido de um teatro, a fim de que possa vir a assumir uma identidade própria e nacional.16

Ficam evidentes, na citação acima, alguns pontos de contato com a Política Nacional de Cultura, especialmente a articulação entre a preservação da memória e o desenvolvimento de um teatro legitimamente nacional. As ações voltadas para o incremento do patrimônio documental do SNT possuem, assim, o propósito de construção e difusão de uma identidade nacional para o teatro, algo que ainda não havia sido objeto de uma intervenção mais elaborada por parte do órgão.

A essa altura, cabe uma rápida menção à situação da preservação da memória do teatro no Brasil. Desde fins do século XIX, principalmente a partir da década de 1940, foi consolidada uma determinada historiografia do teatro, elaborada principalmente por críticos teatrais intimamente relacionados com o processo de modernização dessa arte. De acordo com esses intelectuais, que apenas levavam em consideração o que acontecia nos espaços do Rio de Janeiro e de São Paulo, as práticas cênicas estavam em desacordo com os paradigmas de uma arte “verdadeira”, pois toda a produção do espetáculo era voltada para agradar o gosto do público, ou seja, para gerar bilheteria (Brandão, 2001).

Essa abordagem contribuiu para a perspectiva de que o teatro brasileiro era uma arte de baixa qualidade estética e moral, e sem valor pedagógico civilizatório (Guinsburg; Patriota, 2012). Ou seja, consistia em tudo aquilo que não era considerado um “bom” teatro, seguindo os moldes ilustrados da época. Esse debate também se faz relevante para compreendermos como foram poucas as iniciativas para a preservação desse passado. Apesar de existirem algumas vozes preocupadas com a questão, ela apenas recebeu um encaminhamento por parte do SNT no final da década de 1950, porém sem um desdobramento efetivo. Como já mencionamos, seu museu nunca entrou em funcionamento (Lopes, 2020).

Na apresentação do Projeto Memória do Teatro, na passagem destacada acima, já não há mais menção ao antigo museu. Na prática, o Projeto Memória, definido “como um plano de coordenação de atividades interdependentes”,17 sistematizou as ações que já vinham sendo desempenhadas desde o início da gestão de Miranda (banco de peças, coleta de depoimentos, incentivo às novas publicações), com acréscimo de outras. “Todas essas operações compreendem a preservação dos textos do teatro brasileiro e registro da atuação cênica, com a documentação do espetáculo teatral (e de seus participantes) no passado e no presente”.18

Uma das novidades implementadas foi a criação do setor de Registro de Espetáculos, cuja finalidade era registrar todos os espetáculos teatrais encenados nas principais cidades do país. Humberto Braga, servidor aposentado que já estava na instituição e faleceu recentemente, nos relatou que se tratava de um trabalho minucioso e que representou uma grande inovação para as atividades rotineiras do SNT:

Um programa de “registro” com profissionais contratados em todos os estados responsáveis por recolher materiais impressos (programas, cartazes, recortes de imprensa, críticas onde existiam, dentre outros), de tudo ou quase tudo que acontecia no estado, remetendo para um setor específico da instituição onde este acervo era tratado e publicado anualmente. Num país grande como o nosso, e numa época quando não existia a internet nem os avanços tecnológicos, era um trabalho artesanal que dependia de um esforço considerável.19

Havia, pois, uma ênfase e uma especificação do alvo da política de preservação da memória em construção pelo SNT, com grande destaque para o que era produzido naquele momento. Sendo a atuação do Museu do SNT praticamente irrelevante, e tendo em vista esse espraiamento da concepção de memória (não apenas o passado do teatro, mas também o presente), foi, portanto, uma ocasião oportuna para a reavaliação de determinadas práticas institucionais.

É preciso, entretanto, para se entender perfeitamente a conceituação do Projeto Memória, não o caracterizar apenas como algo que se relaciona com o passado, como o registro simples de acontecimentos. Não é algo que possa ser definido apenas como preservação do patrimônio artístico e documental, mas algo que também funciona em relação ao presente e até visa a uma atuação futura. [...]. Não se deve, pois, atribuir ao Projeto Memória uma conotação museológica. Esta “memória” aqui deve antes ser entendida no sentido mais moderno de computadorização, não como um museu histórico ou como preservação de caráter nostálgico, mas como um amplo banco de dados. O Projeto Memória prevê, assim, uma constante alimentação, como um computador, para nos dar respostas e indagações presentes e futuras. Assim entendido, o projeto se reveste de uma dinâmica especial, como algo que está em processo contínuo e que se caracteriza, enfim, como uma estrutura aberta.20

Como mencionamos, a preservação do passado teatral era muito precária e esbarrava nas dificuldades de valorização da própria arte no país. O estabelecimento de um centro de documentação representou, para o SNT, a possibilidade de “restituição” das lacunas dessa memória, por permitir preservar o que fosse histórico, como também documentar o presente através do registro de informações atualizadas. E essa nova perspectiva encontrou seu devido aporte conceitual e prático na constituição dos centros de documentação, em expansão durante a década de 1970 (Moreira, 1990).

Na verdade, a estruturação de um setor de documentação dedicado ao teatro foi iniciada ainda em 1975, antes mesmo do lançamento oficial do Projeto Memória do Teatro: “Contando com um mínimo de pessoal especializado, buscou-se dar atendimento aos consulentes através de uma organização e classificação empírica do material existente”.21 Estava em marcha, portanto, um investimento contínuo na ressignificação política, teórica e metodológica da preservação da memória do teatro brasileiro por parte do SNT. Esforço esse que visava à implementação de um centro que articulasse a preservação da memória e sua difusão. Para tanto, a fim de viabilizar a formação de um patrimônio documental o mais “completo” possível, com registros do presente e do passado, foi lançada a Campanha de Doação.

A Campanha de Doação: subsídios para a criação de um centro de pesquisas para o teatro brasileiro

Em 1978, o processo de reestruturação do SNT estava em franca atividade, com frentes de trabalho diversificadas (a dança e o circo passaram a integrar o seu escopo) e em articulação com as diretrizes do MEC.22 Apesar do seu bom desempenho, quando comparado às décadas anteriores, existia um risco iminente de ser incorporado pela recém-criada Funarte. Num primeiro momento, estava prevista a implantação na fundação de um instituto voltado para o teatro, o que causaria a absorção do SNT. Porém, na prática, a relação que se estabeleceu entre as duas instituições, de relativa subordinação do SNT à Funarte, possibilitou um maior fluxo de recursos para o órgão. Isso contribuiu para sua reformulação e para seu fortalecimento junto ao setor teatral, que se posicionou contrário ao seu fim (Lopes, 2020).

A Campanha de Doação foi uma dessas iniciativas realizadas com intuito de atribuir novos sentidos ao Serviço Nacional de Teatro, como a construção de centro de memória para o teatro, viabilizada, também, pelas doações que seriam captadas. Assim, esse impulso no incremento de seu acervo reafirmava a linha de atuação que já vinha sendo implementada pelo órgão.

Idealizada como uma tentativa de preencher supostas “lacunas”, referentes aos “primórdios do teatro brasileiro” (Diamante, 1979, p. 15), a campanha foi colocada em funcionamento como uma promessa de ampliação do acervo documental do SNT. Ainda segundo a sua coordenadora, Janine Diamante (1979), essa “ausência” de um passado mais distante da arte teatral no SNT se devia à dispersão da documentação por outras instituições de custódia (Biblioteca Nacional e Arquivo Nacional) e à permanência dos documentos em poder dos próprios profissionais e/ou de suas famílias. Não podemos perder de vista, ainda, o pouco valor patrimonial atribuído ao passado teatral brasileiro, no geral.

Desse modo, o SNT pretendia incentivar doações através da campanha para constituir um acervo especializado em sua área de atuação e, posteriormente, consolidar-se também como um centro de pesquisas em tais temáticas. O ofício circular que foi elaborado para ser distribuído para os mais diversos setores ligados ao campo teatral solicitava doações de “cartazes, programas de peças, fotos, revistas especializadas, noticiário da imprensa, ou outro tipo de documentação”, como, por exemplo, edições de roteiros de peças raras ou pouco acessíveis, além de textos datilografados de peças de autores brasileiros.23 O ofício pedia também que os documentos entregues viessem devidamente identificados: as pessoas retratadas nas fotografias, datas, os dados biográficos de autores de peças etc.

Concomitantemente ao lançamento da Campanha de Doação, Orlando Miranda explicitava seu projeto de implementar a nova estrutura na reportagem “A boa memória do teatro”, de Vivian Wyler, para o Jornal do Brasil: “O objetivo do Centro é incorporar o teatro definitivamente como elemento de estudo e não só entretenimento e objeto da cultura de alguns".24 Apesar da divulgação, o incipiente Setor de Documentação ainda não dispunha de um grau de articulação entre pesquisa e documentação capaz de dar forma a tal centro, o que apenas aconteceria alguns anos adiante. É importante, no entanto, perceber a existência de um propósito, iniciado com o Projeto Memória e ampliado pela Campanha de Doação, que iria finalmente desembocar no Centro Nacional de Estudos das Artes Cênicas (Cenacen), em 1982. A despeito do ânimo expresso pelo diretor do SNT, ainda era o momento de “preparo do terreno” para a efetivação de um centro de memória.

Janine Resnikoff Diamante pode ser considerada a “mestra de obras” dessa construção, a força motriz da Campanha de Doação. Profissional de documentação, além de membra da Associação dos Arquivistas Brasileiros e “perseguidora implacável de souvenirs do passado do teatro”.25 Ingressou no SNT em 1976 e imprimiu uma característica muito particular à ação de captação, pautada pela aproximação entre a instituição e o doador como forma de estabelecer uma relação de confiança e, assim, garantir o fluxo de doações.

Como resultado, foram alcançadas, nos anos de 1978 e 1979, 274 doações. Desse total, vinte eram de indivíduos que já haviam doado antes. Ou seja, a campanha obteve êxito no seu propósito de “conquistar” os doadores, para que retornassem com mais material.26 Como assinala Janine na mesma matéria do Jornal do Brasil em que destacamos a participação de Orlando Miranda:

Na maioria das vezes, os artistas, principalmente os mais velhos, não gostam de dar nada, eles sentem que se derem estão aceitando a ideia da morte como algo próximo [...]. Eu não peço, então, para que me deem coisas tão importantes para eles. Mas dispensem programas, convites de apresentações de colegas seus que não tenham tanta importância para eles e que para nós são fundamentais.27

Muitas dessas doações ocorriam em vida, o que provavelmente dificultava a dissolução dos laços entre os titulares dos acervos e seus papéis, marcados por recordações e afetividade, como uma materialização de suas vidas. Daí o empenho da equipe em garantir que houvesse uma constante alimentação por parte dos doadores, para assegurar o desejado preenchimento de lacunas, tão frisado nos textos institucionais sobre a Campanha de Doação. Não foi por acaso que obteve ótimos resultados em seu primeiro ano.

Porém, a partir do final da década de 1970, o impasse entre o SNT e a Funarte gerou uma grave crise institucional. A forte reação da classe teatral, contrária à incorporação, acarretou sucessivos adiamentos pelo próprio Ministério da Educação e Cultura. Porém, a criação da Secretaria de Assuntos Culturais, em 1978, provocou a retirada do SNT do organograma do ministério e seu desaparecimento da administração federal. Existindo de forma precária, o SNT resistia e continuava a empreitada de modernização iniciada em 1974.

Ainda assim, a despeito das graves dificuldades administrativas e financeiras vivenciadas pelo SNT, a Campanha de Doação não demonstrava sinais de esgotamento. Mesmo com as queixas da coordenadora de que o programa necessitava de maior divulgação por parte da instituição, foi capaz de reunir um valioso acervo durante esse período. Devido à atuação de Janine Diamante, que possuía grande circulação junto aos artistas e/ou seus herdeiros, e aos êxitos obtidos, a campanha foi se consolidando enquanto uma importante ferramenta de divulgação e de aproximação da classe teatral. Dessa forma, adquiriu uma significativa autonomia dentro do SNT, o que certamente colaborou para a sua longevidade, bem como de suas práticas de organização do que era doado, as quais apenas foram objeto de crítica quase dez anos após o seu lançamento.

Um aspecto que se consolidou a partir da década de 1980 foi a realimentação das doações. Diamante e equipe lograram êxito na sua aproximação aos doadores, pois muitos retornaram a depositar mais documentos na instituição. Entre os anos de 1980 e 1981 foram recolhidas 253 doações, sendo que 127 consistiram em retorno de titulares que voltaram para trazer mais documentos. Ao mesmo tempo, as novas doações foram reduzidas a cada ano: entre 1978 e 1979 foram 224 e, entre 1980 e 1981, 126, representando uma queda de 43,75% em relação ao período anterior.28

As solicitações para maior apoio do SNT na divulgação da campanha, presentes no Relatório de Atividades do último semestre de 1979, eram sintomáticas da diminuição do fluxo de novas doações, o que também se verifica nos anos seguintes. Porém, o trabalho junto aos futuros doadores (recebimento no setor, com direito à explicação dos objetivos da campanha e do tratamento dado ao acervo, visitas às suas casas para selecionar documentos), mantinha o bom ritmo de entrada de documentos no acervo.

Em certa medida, esse corpo a corpo realizado pela equipe da campanha também servia como divulgação para que novos doadores fossem alcançados, como acentua Elizabeth Araújo, servidora que atuou como assistente de Janine Diamante:

A gente fazia releases para mandar pela imprensa, tudo pela Funarte, pelo SNT. Aí ajudávamos a fazer cartazes, programa [...]. Então o artista tinha sempre essa receptividade – tanto [...] o artista, o medalhão, como o que estava iniciando – tinha sempre esse tratamento. A casa ficava cheia de artistas, cheia, cheia, cheia. Era um entra e sai, um entra e sai. Porque era assim, muito querido mesmo.29

Outra competência desenvolvida pela Campanha de Doação e que estava diretamente relacionada com essa ação de divulgação era a organização de exposições, também conforme Araújo: “Daquele material a gente produzia as exposições [...] e era importante. E com isso a gente acabava divulgando o projeto e, ao mesmo tempo, tendo um trabalho junto com ele”.30

Algumas personalidades acabavam chamando atenção do noticiário para a sua doação, também funcionando como um eficiente chamariz para a ação do SNT. Foi o caso do empresário teatral Walter Pinto, que doou seu inestimável acervo no início de 1980. A efeméride foi noticiada com grande destaque na coluna de Zózimo Barroso do Amaral, no Jornal do Brasil:

A grande Campanha de Doação lançada pelo Serviço Nacional do Teatro [...] acaba de incorporar um importante acervo. Seu doador é Walter Pinto – a 250ª pessoa a contribuir para a campanha – que transferiu para o projeto todo o acervo acumulado durante os vários anos em que produziu espetáculo de teatro de revista, até então um setor pouco representado na coleção reunida pelo SNT.

A campanha, com doações do Brasil inteiro, continua, pelo menos até que se esgote o espaço destinado a acolher a massa de documentação recebida, que no princípio ocupava oito arquivos e hoje atulha nada menos de 68.31

Todos esses relatos, reportagens e documentos da instituição corroboram para uma percepção de uma relativa autonomia da Campanha de Doação dentro do SNT. Ao mesmo tempo em que atuava em conjunto com o Setor de Documentação, não estava submetida à sua organização administrativa, respondendo diretamente à assessoria do gabinete do diretor do Serviço.32 A própria proposta do Projeto Memória, de ser uma estrutura aberta, favoreceu a articulação de inúmeras frentes de trabalho, sem que estivessem, necessariamente, centralizadas em um setor específico. Daí a multiplicidade de atividades desempenhadas pelos funcionários da Campanha de Doação.

Possibilitada, em grande medida, pelos meios advindos da Funarte, a qual também era a razão da grave crise institucional enfrentada pelo Serviço, a Campanha de Doação e sua diminuta equipe conseguiram criar táticas que garantiram o seu bom funcionamento e a sua continuidade: “E a gente não tinha verba de nada. A gasolina saía do bolso da minha chefe, da Janine. Às vezes, a gente tinha doação e tinha que ir para outro lugar, [...] ir lá para Mendes buscar [...] doação do primeiro palhaço negro do Brasil, Benjamim de Oliveira”.33

Porém, mesmo assim, a situação administrativa do SNT ainda não estava equacionada. Em um processo de morte anunciada, o SNT agonizava entre duas possibilidades: a efetivação de sua incorporação à Funarte, como estava previsto por lei, ou a criação de uma fundação nacional dedicada às artes cênicas, que era o desejo da maior parte da classe teatral. E a opção escolhida pelo governo federal foi o caminho do meio: um instituto dotado de autonomia relativa, e com certo grau de ligação com a Funarte. Assim, mediante uma ação conciliatória entre os anseios do setor e as prioridades do Ministério da Educação e Cultura, foi criado o Instituto Nacional das Artes Cênicas (Inacen) em 1981. O projeto para a criação de um centro de memória para as artes cênicas, uma vez que a nova instituição as trazia em seu próprio nome, começava a encontrar um solo mais fértil para se tornar uma realidade.

Cenacen: carvão para a locomotiva Inacen

Após a criação do Inacen, em novembro de 1981, foram iniciados os procedimentos de transição, ainda sob o comando de Orlando Miranda, responsável por implantar o novo órgão. No decorrer dos trabalhos de concretização do Inacen, o prédio já se encontrava no limite de sua capacidade para o funcionamento do SNT, e não comportaria a nova estrutura.34 Procurado pelo crítico Yan Michalski para falar sobre esses e outros assuntos, Miranda compartilhou suas preocupações a respeito dos riscos a que estava sujeito o acervo ali guardado:

Temos aqui a documentação funcional de centenas de pessoas que em mais de quarenta anos passaram pelo SNT. E temos uma inestimável documentação artístico-cultural, além de uma valiosíssima biblioteca. Se o prédio, no precário estado em que está, sofrer algum sinistro, como por pouco não aconteceu, só restarão cinzas e acusações por não terem sido tomadas providências a tempo. Hoje até receio recolher as doações de material de documentação que nos são feitas. Por outro lado, falta-nos espaço para a expansão daquilo que julgo poder vir a ser a nossa parte mais importante, que é justamente o setor de documentação.35

Fica claro, pois, o protagonismo do Setor de Documentação para a direção do SNT e, agora, também do Inacen, posto que uma marca desse processo foi a continuidade administrativa que caracterizou a sua efetivação. Em maio de 1982, começou a transferência de parte do órgão para um prédio na avenida Rio Branco, em frente à Cinelândia, também no centro do Rio de Janeiro.

Abria-se espaço, dessa forma, para a ampliação das vertentes de trabalho pretendidas para a área da documentação. “Antes um mero receptor, armazém de cartazes e programas, o Cenacen terá todo o antigo prédio do SNT para se desenvolver, como centro de documentação e difusão cultural".36 O Centro de Estudos Nacional de Artes Cênicas (Cenacen) foi criado em 29 de dezembro de 1982 e seu primeiro diretor foi o ator, roteirista, professor e crítico teatral Clovis Levi.

O Cenacen entrou em atividade com a finalidade de viabilizar as atividades dos quatro serviços do Inacen (teatro, dança, ópera e circo), atuando em duas frentes: a difusão cultural e a documentação. O prédio do Centro, a antiga sede do SNT, foi reformado e passou a contar com uma livraria especializada, a Ver e Ler; uma sala permanente de exposição, a Sala Aloísio Magalhães; o Auditório Murilo Miranda; e o Teatro Glauce Rocha. Além da documentação e pesquisa, o Cenacen também desempenharia uma nova e decisiva vocação para o estabelecimento do novo instituto: a difusão cultural, entendida como a promoção de cursos, concursos, premiações, edições e lançamentos de livros e material cênico e técnico.37

Houve, assim, uma transferência da versatilidade de atividades do Projeto Memória para o Centro de Estudos Nacional das Artes Cênicas. A concepção de estrutura aberta do Projeto Memória, presente nos relatórios que explicitavam a iniciativa, em 1976, articulando diversos setores sem estar subordinada a nenhum deles, foi absorvida enquanto “missão” do novo Cenacen, agora centralizado administrativamente.

Vê-se, por conseguinte, que o Projeto Memória acabou por se constituir em uma eficiente estratégia não só para dinamizar o SNT frente às suas dificuldades, como para moldar a organização futura. À medida que novas áreas foram incorporadas ao SNT (circo, dança e ópera, já no Inacen), ampliou-se o raio de ação que deveria ser atendido pelo Projeto Memória. “Que uma coisa fique clara”, comenta Orlando Miranda, “o Cenacen é a lenha, e o Inacen é o vagão”.38

Porém, a despeito de sua centralidade para a formação do Cenacen, o Projeto Memória passaria a ficar restrito à Campanha de Doação na nova estrutura, não existindo mais nos moldes anteriores. A campanha foi situada na Divisão de Documentação e Pesquisa do Cenacen, juntamente com o Registro de Espetáculos, o Banco de Peças, o Arquivo Textual, o Arquivo Fotográfico, a Videoteca e o Arquivo de Música para Teatro.39

Com a concretização do Instituto Nacional das Artes Cênicas, o Projeto Memória do Teatro também precisou contemplar outras áreas cênicas, passando a ser nominado Projeto Memória das Artes Cênicas. No entanto, àquela altura, já era amplamente divulgado pela imprensa apenas como Projeto Memória. Nesse novo contexto institucional, teve suas ações incorporadas pelo Cenacen, porém com menos “ambição”. No que refere à Campanha de Doação, que continuava em plena atividade apesar das dificuldades, observamos que Janine Diamante foi mantida na coordenação. O problema fundamental era, como sempre, o da exiguidade orçamentária do Inacen.

Por se tratar de um período de reacomodação de atividades e criação de novas ações, não localizamos todas as informações oficiais a respeito da Campanha de Doação, entre 1982 e 1984. Porém, através do noticiário impresso da época, é possível perceber que ela ainda manteve certo grau de autonomia em relação à direção do Cenacen. O próprio ex-diretor do centro confirmou nossas impressões, em sua entrevista de 2020:

O Projeto Memória e a Campanha de Doação já existiam antes do Cenacen ser estruturado. O Cenacen incorporou uma atividade que já funcionava autonomamente no Inacen, entendeu? A Janine [Diamante] tocava brilhantemente esse projeto, e ela tinha muita autonomia. Então, praticamente, eu não me lembro de ter feito nenhuma interferência no trabalho [dela]. A coisa se dava muito bem; a Janine realmente fez uma administração brilhante.40

Localizamos relatórios com dados quantitativos referentes apenas aos anos de 1982 (primeiro semestre) e 1983. Nesse período foram 353 doações (148 novas e 205 realimentações).41 O intervalo 1982-1983 apresentou, pois, um aumento de 14,86% na quantidade de novos doadores em relação ao período anterior de 1980-1981, mesmo com os dados desfalcados do segundo semestre de 1982. Já em relação às realimentações (doadores que retornaram para completar suas doações anteriores com mais documentos), houve um incremento de 62%. O segundo semestre de 1983 reverteu em parte esse panorama de predominância das realimentações, no cômputo geral de doações. As novas doações representaram 55,22% do total das doações reunidas naquele período.

Identificamos, ainda, o uso dos primeiros recursos gráficos de divulgação da campanha, iniciativa que viria a contemplar algumas das solicitações de Janine Diamante em relação ao maior incentivo à sua circulação.


Figura 1 – Cartaz Projeto Memória – Campanha de Doação [1984]. Fonte: Cedoc/Funarte

Não foi possível localizar o relatório sobre as atividades da campanha no ano de 1984. Porém, em um dos releases liberados para sua divulgação na imprensa, obtivemos a informação de que, até a data de seu sexto aniversário – em agosto de 1984 – a Campanha de Doação havia atingido a marca de 553 doadores e 610 realimentações.42 Em maio de 1984, foi noticiado no Jornal do Brasil que a campanha já havia revertido 74.595 documentos textuais, 8.503 livros e impressos e 22.178 fotografias.43 Percebemos, de acordo os dados apresentados, que a Campanha de Doação representou uma bem-sucedida via de aquisição e desenvolvimento de acervo. Por outro lado, o grande afluxo de documenos, face às limitações espaciais e de pessoal daquele momento, acabou por suscitar algumas reflexões sobre o seu ritmo, especialmente a partir de mais uma transformação institucional e um novo contexto político.

Um acervo fragmentado: metodologias adotadas pela Campanha de Doação e seus impactos

Ao mesmo tempo em que proporcionou uma rica experiência de formação de acervo, possibilitando, até mesmo, a transferência de arquivos pessoais, as práticas empregadas pelos profissionais da Campanha de Doação imprimiram no acervo uma questionável característica: a não preservação da integridade dos conjuntos arquivísticos. Ao longo de sua atividade, foram recolhidos álbuns de recortes, programas e fotografias; caricaturas; diplomas; discos; fotografias; negativos; cartazes; livros; periódicos; peças manuscritas, datilografadas ou impressas; cadernos de anotações; borderôs; cartas manuscritas ou datilografadas; telegramas; livros contábeis de companhias teatrais; medalhas; partituras; quadros emoldurados; programas; recortes de jornais e revistas; convites; documentos pessoais; croquis de cenário; maquetes; ingressos e cadernos de autógrafos.44

Destacamos que Janine Diamante, que ingressou no SNT em 1976, participou do processo de transformação do museu em acervo teatral e, em seguida, na sua integração ao Setor de Documentação. Acreditamos, dessa maneira, que ela tenha participado da criação dos critérios classificatórios a serem empregados na organização dos documentos do acervo, pautados por uma “urgência” na recuperação da informação.

Portanto, a campanha nada mais fez do que continuar a aplicar tais pressupostos ao encaminhar os documentos isoladamente aos respectivos setores, de acordo com o gênero e a espécie de cada um. À morosidade atribuída ao Museu do SNT, dedicado ao “culto do passado” – como foi criticado em tantos documentos oficiais, e nas entrevistas concedidas por Orlando e Janine – pretendia-se contrapor a eficiência do novo modelo, o serviço de documentação e pesquisa. Entretanto, nunca, na trajetória do extinto museu, houve condições tão propícias para o desenvolvimento de políticas de preservação da memória como aconteceu a partir de 1974.

Existia, porém, uma “pressa” institucional na obtenção de resultados. A campanha foi, então, uma ferramenta para alimentar as linhas de acervo definidas para o Setor de Documentação recém-constituído e já anunciado à imprensa, como um centro de memória. Ameaçado pela absorção por parte da Funarte, o SNT tinha muito pouco tempo para chamar, para si, todo o protagonismo que sempre lhe foi exigido por parte da classe teatral. Só assim poderia ser bem-sucedido nas negociações para a manutenção de sua autonomia, junto ao Ministério da Educação e Cultura. No campo do patrimônio, a estratégia assumida, embora eficaz na composição de um acervo robusto, acabou por impactar, sobremaneira, a integridade dos arquivos pessoais que foram transferidos para a instituição.

Porém, à essa época, os arquivos já tinham começado a ser interpretados à luz da teoria arquivística. Ainda em 1973, foi criado o Centro de Pesquisa e Documentação em História Contemporânea do Brasil (Cpdoc), “a partir de um conjunto documental fundador do perfil de seu acervo e das linhas iniciais de pesquisa: o arquivo pessoal de Getúlio Vargas” (Camargo, 2003, p. 29). Portanto, no mesmo momento em que diversos arquivos pessoais de indivíduos relacionados ao campo das artes cênicas eram captados pela Campanha de Doação, já não era incomum a compreensão da dimensão arquivística desses conjuntos.

No caso do Setor de Documentação do SNT, o seu projeto para formação de acervo repousava na intenção de preencher as “lacunas” da história do teatro brasileiro, recolhendo e disponibilizando a maior quantidade possível de informações. Houve, assim, a prevalência da “informação” em relação ao documento, o qual foi entendido, segundo essa perspectiva, como apenas um suporte para o conteúdo nele registrado. Por essa razão, a natureza arquivística dos conjuntos provenientes de artistas e demais profissionais da cena não foi considerada como relevante. Portanto, essa perspectiva foi reforçada pela não compreensão, por parte dos responsáveis pela elaboração e implementação da Campanha de Doação, de que acervos de caráter pessoal também podem ser arquivos. Dessa forma, eles incorporaram os mesmos princípios organizadores do Setor de Documentação às doações, indiscriminadamente.

Ainda que, na teoria, a interdisciplinaridade permeie o modelo institucional do centro de documentação, prevaleceram os critérios da Documentação como os mais eficazes para cumprir com os objetivos perseguidos pelo órgão naquele momento. A princípio, os centros de documentação estão aptos a atribuir o tratamento técnico mais adequado aos documentos, de acordo com as suas características específicas. Assim, podem abrigar, ao mesmo tempo, acervos museológicos, bibliográficos e arquivísticos. Nem mesmo o suporte deve ser o critério pelo qual se define a metodologia a ser empregada, pois não devemos confundir o acondicionamento físico – que precisa ser específico para determinados gêneros documentais, como o iconográfico, por exemplo – com o seu processamento técnico.

Por isso, a criação de um Setor de Documentação no SNT e sua continuação no Inacen não deveria implicar, necessariamente, a inexistência de arquivos pessoais na constituição de seu acervo. “Não é a condição de um documento – manuscrito ou impresso, avulso ou encadernado, papel ou disquete, objeto ou não – que o define como um documento de arquivo, de biblioteca, museu ou centro de documentação, mas sim a sua origem e função” (Tessitore, 2003, p. 11). No entanto, os critérios observados quando da entrada das doações, a fim de determinar os métodos de organização mais adequados para cada caso, foram apenas o gênero e a espécie documental.

“A cultura não é mais a mesma”: a memória das artes cênicas e a redemocratização

No primeiro semestre de 1985, Orlando Miranda anunciou sua saída do Inacen: “quando entrar o novo governo, no caso o presidente Sarney, após 11 anos, eu achei que havia chegado a hora de ir embora” (Miranda, 2009, p. 40). Mesmo após a criação do Inacen, Miranda e sua equipe mantiveram-se alinhados com diversos representantes das artes cênicas a respeito da necessidade da criação de uma fundação para a área, pois, segundo seus defensores, seria a estrutura administrativa mais eficaz para fomentar e desenvolver as políticas públicas. Ou seja, ainda que o Inacen tenha atendido algumas das necessidades existentes, não abarcava plenamente todas as demandas do circo, do teatro, da dança e da ópera.

Em 21 de abril de 1985, José Sarney tomou posse, em virtude do falecimento do então presidente eleito Tancredo Neves. Iniciava-se a Nova República, conforme se convencionou chamar esse retorno do país ao regime democrático. Com a redemocratização, resultado de eleições indiretas, realizadas apesar do clamor popular conhecido como “Diretas Já!”, novas alterações impactariam o contexto institucional dedicado ao desenvolvimento de políticas públicas para as artes cênicas.

Naquele mesmo ano, Carlos Miranda, diretor do Serviço Brasileiro de Teatro do Inacen, foi nomeado presidente do instituto. Ele convidou a jornalista, crítica teatral, dramaturga, pesquisadora e professora Tania Pacheco para assumir a direção do Cenacen, após a saída de Clovis Levi. Seu primeiro ano à frente do Centro de Estudos se balizou por quatro objetivos principais: formação (apoio a entidades para publicação de revistas e livros, edição de obras de textos técnicos, dramatúrgicos, ensaios e estudos, e a realização de cursos e oficinas); pesquisa; descentralização da memória e da pesquisa em artes cênicas; e ampliação do quadro de funcionários.45

Por outro lado, não identificamos, no relatório de 1986 do Cenacen, uma referência direta à Campanha de Doação ou ao Projeto Memória, o que evidencia que não constavam dentre as prioridades daquele momento, embora jamais tenham sido paralisados. Janine Diamante apresentou para a nova diretora seu descontentamento com a situação em que se encontrava a Campanha de Doação, no final de 1985.

Sentimos falta de apoio do próprio órgão na valorização dessas doações, que são importantíssimas e abrem um leque enorme no sentido de enriquecer o material para os pesquisadores e aumentar o nosso acervo, pois é este o nosso alvo, e não sermos meros guardadores de documentos, mas sim uma memória ativa e aberta a todos. Mas o problema é que com as doações, todas as seções têm muito mais trabalho, por isso não dão o devido valor ao projeto e não o incentivam. Daí mais uma vez repetimos: as doações são de responsabilidade de todos do Inacen-Cenacen [...].46

Apesar da manifestação inflamada de Diamante, foi elaborado nesse período um novo cartaz de divulgação da Campanha de Doação, o que demonstra que a ação ainda não havia sido cancelada, sete anos após o seu início:


Figura 2 – Cartaz Projeto Memória – Campanha de Doação [1986?]. Fonte: Cedoc/Funarte

Na verdade, com a absorção das atividades do Projeto Memória pelo Cenacen e a progressiva estruturação de unidades administrativas para desempenhá-las, ocorreu o início do “enquadramento” das ações da Campanha de Doação que, até então, gozava de grande autonomia. De fato, o Cenacen buscava seu estabelecimento, além de apoiar o Inacen em sua jornada de descentralização por todo o país. A entrada de novos acervos através das doações passou a ser entendida como mais uma das rotinas do centro e, dessa forma, também precisava de maior integração com o setor:

Eu simplesmente saí [...] abrindo todos os armários que tinham [...]. E tinham armários gigantescos de madeira que iam até o teto [...]! Tinha de tudo ali dentro! Simplesmente eram caixas e mais caixas [...]. Tinham de tudo, porque a Janine ia conseguindo as coisas e ia guardando. [...]. Assim, tirei máquina de escrever, tudo de cima das mesas, e saí colocando as coisas em cima [...], para pelo menos eu entender [o que havia]. Por isso é que eu te digo, minha participação era muito mais na luta em Brasília etc., para conseguir a contratação de pessoas, para conseguir a formação de equipe.47

Pacheco fez um importante diagnóstico a respeito da desconexão entre a captação dos documentos e o seu tratamento técnico. Como também fora reportado por Diamante em seus relatórios, os setores alimentados pela Campanha de Doação não eram capazes de absorver tamanho volume de documentos. Para solucionar esse descompasso, um dos principais objetivos do Cenacen em 1986 foi, justamente, a contratação de profissionais especializados, como bibliotecários, arquivistas, pesquisadores e técnicos da área de informática, para iniciar um projeto de informatização do Inacen.48

Enquanto acontecia toda essa movimentação interna no Inacen, outras mudanças estruturais eram desencadeadas na esfera do governo federal. Ainda em 1985 foi criado o Ministério da Cultura (MinC), através do decreto n. 91.144, de 15 de março. O início do seu funcionamento foi caracterizado pela instabilidade política, o que prejudicou a formulação de uma agenda cultural nesse primeiro ano de governo Sarney, afetando grandemente as atividades do jovem Instituto Nacional das Artes Cênicas. Somente em 1986, o economista Celso Furtado aceitou sua indicação para comandar a estruturação da pasta (Calabre, 2009).

Dentre as mudanças que foram implementadas no ministério, destaca-se a transformação do Inacen em fundação. A iniciativa do ministro ia ao encontro da antiga luta empreendida pelo setor das artes cênicas, em especial do teatro. Uma vez criada a Fundação Nacional das Artes Cênicas (Fundacen),49 em 1987, a área adquiria autonomia financeira, patrimonial e administrativa, desligando-se definitivamente de qualquer tutela em relação à Funarte, o que permitiria maior agilidade para realizar projetos e mais possibilidades de captação de recursos, conforme assinalou Carlos Miranda, em entrevista para matéria intitulada “A cultura não é mais a mesma”, do Jornal do Brasil.50 A Fundacen entrou em funcionamento em 1988, após a publicação do seu estatuto.51 A partir de então, o Cenacen passou a figurar oficialmente no organograma da instituição.

No decorrer da tramitação do projeto de criação da Fundacen, outras ações foram colocadas em prática para racionalizar as dificuldades enfrentadas pelo Cenacen em relação ao seu acervo. Conforme texto de um relatório de atividades de 1987, vemos os esforços dispendidos para conhecer e articular as várias atividades que vinham sendo realizadas no âmbito do Cenacen:

Na verdade, o Centro de Estudos [...] nasceu de forma inteiramente pragmática, ditada pelas próprias necessidades crescentes do Inacen como um todo. Os inúmeros documentos captados pelo organismo, ao longo de décadas, foram se avolumando num acervo que viria a constituir, inicialmente, a Divisão de Documentação. Obrigações com premiações e concursos determinavam publicações sem periodicidade definida, paralelamente ao resgate de clássicos da dramaturgia brasileira. Ofertas e propostas de pesquisadores isolados desembocavam numa feliz coicidência para as artes cênicas, no suprimento de lacunas na sua história. Projetos determinavam a criação, de um lado, de uma livraria; de outro, de uma sala de exposições e de um auditório para ensaios, seminários e debates.

Emprestar organicidade a esses projetos descosidos; estruturá-los de maneira a permitir que cada embrião se transformasse num núcleo cujas ações fluíssem em cadeia, compondo, então, a engrenagem/tessitura de um centro de estudos, vem sendo a tarefa principal do Cenacen, nos últimos dois anos.52

Essa citação corrobora nossa premissa de que o Cenacen era herdeiro direto do Projeto Memória, incorporando e diversificando as suas atribuições a tal ponto que se fez necessária uma reorganização interna. Assim, foram criadas, para estruturar as rotinas administrativas, duas coordenadorias dentro do Cenacen: Coordenação de Pesquisa e Documentação e Coordenação de Difusão Cultural. Para assumir a área de pesquisa e documentação, foi convidada a pesquisadora e professora Sonia Rummert. Ao assumir, ela se deparou com os problemas já identificados por Tania, os quais implicavam péssimas condições de guarda dos documentos que eram captados pela Campanha de Doação. Referindo-se ao ano de 1987, em sua entrevista de 2020, ela relembra:

Não havia espaço físico para guardar mais documentos, não havia. Nós tínhamos algo em torno de dois milhões de documentos [...]. E o Projeto Memória, que era o projeto da Janine, era uma coisa que tinha um aspecto extremamente positivo, mas era uma loucura. Porque as pessoas, ou as próprias ou os familiares depois, chegavam e depositavam ali, tudo! Entendeu? Tudo! E aquilo era enfiado em armários, em sacos plásticos, sem ordem nenhuma. Uma vez, eu me lembro, estava olhando um armário enorme que tinha lá no fundo da parede toda, aí eu peguei um saco, uma coisa estranha. A máscara mortuária do Procópio Ferreira estava lá dentro.53

Uma vez constatada a precariedade das instalações do prédio do Cenacen para custodiar seu acervo, Rummert registrou a situação em um relatório que foi entregue para Celso Furtado pela direção. Sensibilizado, o ministro deu o seu aval para que o Inacen, futura Fundacen, iniciasse os trabalhos de procura de um prédio adequado para conservar o acervo em condições adequadas.

Com auxílio da Secretaria de Finanças do Ministério da Cultura, Tania Pacheco conseguiu localizar um prédio na rua São José,54 centro do Rio de Janeiro, pertencente ao então Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que foi cedido em comodato para abrigar todas as unidades administrativas da já Fundacen, uma vez que seria necessária uma série de intervenções para adequá-lo ao uso da instituição. O local se encontrava abandonado há alguns anos, e seria preciso reforçar sua estrutura para suportar o peso da documentação.55

As perspectivas de implementação da Fundacen eram bastante animadoras, pois a instituição contaria com uma sede para centralizar suas unidades, então divididas entre o prédio do Teatro Glauce Rocha (Cenacen) e um andar inteiro de um edifício na Cinelândia. Além do mais, ela seria pensada para custodiar da melhor maneira possível o seu acervo, tendo em vista a grande reforma estrutural realizada no edifício.

Vale ressaltar que a conquista do prédio da rua São José, no centro do Rio de Janeiro, atualmente em fase de reforma [1987], vem resolver problemas de instalações físicas que cobrem não apenas aspectos essenciais de condições de trabalho e atendimento ao público, como a ampliação, em condições adequadas, do setor de documentação do Cenacen.56

No tocante à Campanha de Doação, importantes conjuntos documentais continuavam a ser incorporados à instituição, a despeito das dificuldades de ordem técnica e de espaço físico. Nesse momento, mais do que novas doações, a ação era marcada pelo retorno de doadores. Embora a prospecção de acervos nunca tenha sido interrompida, sua designação, aos poucos, foi mudando de Campanha de Doação para Projeto Memória e, ao final da década de 1980, já se encontrava efetivamente subordinado ao Centro de Estudos. Bem diferente do status de autonomia que gozava no Serviço Nacional do Teatro, quando respondia diretamente ao gabinete de Orlando Miranda.

Esse processo avançou pelo ano de 1988, quando a fundação entrou em atividade. Em julho foram criadas, dentro da Coordenação de Pesquisa e Documentação, duas divisões: de Documentação e de Pesquisa. A Divisão de Documentação, por sua vez, estava subdividida em: Aquisição, Registro e Distribuição; Setor de Documentação Iconográfica e Sonora; Biblioteca Edmundo Moniz; Arquivo Central; Laboratório de Restauração (que seria implantado na nova sede ainda em obras, na rua São José).57 Essa nova organização, a qual denota uma maior especialização das atividades desempenhadas no âmbito da documentação, buscava solucionar problemas considerados crônicos, designados como “pontos de estrangulamento”:

a) O acúmulo de documentos sem identificação e/ou qualquer tratamento adequado.

b) A falta de instrumentos de recuperação das informações e a existência de instrumentos falhos, incompletos e incorretos. Este problema, somado ao descrito anteriormente, significa que só está acessível ao público um pequeno percentual do acervo.58

O Projeto Memória e a sua única frente de trabalho em atividade, a Campanha de Doação, passavam a ser compreendidos pelo Setor de Aquisição, com vistas a centralizar a entrada de documentos na instituição. A campanha seguiu em frente entre os anos de 1986 e 1989, captando documentos e conjuntos de grande relevância para os estudos voltados para as artes cênicas, tais como as doações do ator Ítalo Rossi, do cenógrafo Walter Bacci, do crítico teatral Yan Michalski, do ator Ângelo Labanca, além das incontáveis contribuições de pequeno porte.

Assim como nos anos anteriores, as realimentações foram preponderantes no montante geral do que fora captado entre 1986 e 1989 (63,10%).59 Em 1988, as novas doações quase se equivaleram ao retorno dos doadores, mas não se formou uma tendência para o ano seguinte. Acreditamos que as notas comemorativas de dez anos da Campanha de Doação, divulgadas pela imprensa, podem ter motivado algumas das novas doações.60 Ao lidarmos com índices quantitativos, temos a impressão de que as desacelerações de alguns anos poderiam significar certo fracasso, porém, se imaginarmos que tais números refletem a quantidade de doadores e não a de documentos doados, podemos ter uma perspectiva mais clara.

As pequenas doações eram mais numerosas, conforme pudemos avaliar nos relatórios e no acervo que a campanha constituiu. Porém, grandes arquivos pessoais também eram doados, o que relativiza os dados referentes à menor quantidade de doações em determinados anos, oferecendo novos elementos para a análise. Os dados quantitativos atestam o funcionamento ininterrupto da Campanha de Doação, ao longo de 11 anos, mas não refletem seu teor qualitativo.

Não restam dúvidas de que o Projeto Memória das Artes Cênicas /Campanha de Doação atingiu seu objetivo: captar a maior quantidade possível de documentos para SNT, Inacen e Fundacen. O grande volume de documentos, frente às dificuldades de disponibilizá-los efetivamente aos usuários, ocasionou sérios impactos para o acervo como um todo. Em virtude desses descompassos, a campanha vinha sofrendo ajustes em seus últimos anos, sendo readequada à nova realidade da instituição. Por essa razão, não acreditamos que estivesse no horizonte do Cenacen suspendê-la, haja vista a produção de material gráfico para a sua divulgação na Fundacen. Porém, questões conjunturais impuseram sua interrupção, bem como a da própria fundação.


Figura 3 – Boneca de cartaz para Projeto Memória – Campanha de Doação [1988]. Cedoc/Funarte

O cenário econômico brasileiro durante a presidência de José Sarney era desanimador. Para tentar conter a dívida pública e os altos índices de inflação, três planos econômicos foram elaborados: Cruzado (1986), Bresser (1987) e Verão (1989). Este último previa um enxugamento da administração pública, considerada responsável pelo inchaço do Estado, mediante a demissão de funcionários públicos com menos de cinco anos de serviço e de contratados sem concurso. Se efetivada, essa medida implicaria, na prática, a inviabilização do Ministério da Cultura e da Fundacen. Como reação a essa ameaça, a classe artística se uniu ao Fórum das Associações das Fundações do MinC – formado por Fundacen, Funarte, Fundação Nacional Pró-Memória, Fundação Casa de Rui Barbosa, Fundação do Cinema Brasileiro, Fundação Nacional Pró-Leitura e Fundação João Nabuco – e organizou uma passeata que levou cinco mil pessoas para a Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro (Mendes, 2015).

Diante da repercussão negativa e por se aproximar o final de seu mandato, Sarney arquivou a medida provisória que implementaria tais reformas. No entanto, o seu sucessor, Fernando Collor de Mello, radicalizou a ideia. Sob o pretexto de acabar com a “ineficiência” da burocracia do Estado, promulgou, no mesmo dia de sua posse, duas medidas provisórias cujas implicações afetariam permanentemente a organização do setor cultural na administração pública federal. Foram extintos o Ministério da Cultura61 e 24 entidades, dentre elas a Fundacen.62

O tom de urgência, adotado através do uso de medidas provisórias, que dispensam tramitação pelo Congresso para a realização da reforma administrativa, levam a crer na sua premeditação por parte da equipe do novo mandatário. Esse procedimento desconsiderou os técnicos e gestores das instituições impactadas, bem como impossibilitou a mobilização dos setores afetados, como havia acontecido com o Plano Verão de José Sarney (Mendes, 2015).

Surpreendidos, os funcionários da Fundacen se organizaram rapidamente para garantir o edifício que havia sido adquirido para a sede da instituição. Ainda que houvesse temor sobre o futuro da entidade, tendo em vista os discursos do então candidato Collor, declaradamente favorável a uma redução da atuação do Estado nos moldes neoliberais, a notícia da sua extinção precipitou um último ato de comprometimento e coragem.

Nós mudamos [...] na marra. [...] foi com a ajuda do pessoal do Sindicato dos Atores, né? Nós pusemos, nós fizemos a mudança com eles, dentro dos caminhões, saía da [avenida] Rio Branco e ia para a [rua] São José [...]. Morrendo de medo de aparecer a polícia, porque aquilo na verdade já não era mais, estava mudando uma coisa que não existia, tinha acabado dias antes. Bom, aí ocupamos o prédio, e lá, nós fomos demitidos seis meses depois. É obvio que essa mudança ficou, nós não tivemos como organizar o que havia chegado.63

Este melancólico desfecho foi um duro golpe que paralisou não apenas o Projeto Memória da Fundacen e sua Campanha de Doação, mas todas as atividades culturais, causando um grande impacto que ainda hoje se faz sentir. Para a memória das artes, o prejuízo só não foi maior porque o edifício destinado à sede da Fundacen foi ocupado às pressas por seus funcionários, permitindo que os acervos da Fundação do Cinema Brasileiro e da Funarte fossem abrigados, posteriormente.

Completamente desbaratadas, as competências dos órgãos extintos foram transferidas para dois institutos:64 o Instituto Brasileiro de Patrimônio Cultural (IBPC), responsável pela preservação do patrimônio histórico, e o Instituto Brasileiro de Arte e Cultura (Ibac), que concentrou as artes cênicas, a música, as artes visuais e o cinema.65 Justo quando a redemocratização deveria ser coroada com a realização da primeira eleição direta à presidência após a ditadura, o setor cultural viu-se completamente devastado.

Considerações finais

A partir de meados da década de 1970, a estruturação de uma política nacional para a cultura resultou no incremento das atividades patrimoniais no bojo do SNT. Desse modo, a memória passou a uma posição de destaque nos rumos da reformulação do órgão. Objeto de iniciativas esparsas das gestões anteriores, o contexto político-governamental favorável ao tema possibilitou a Orlando Miranda concretizar importantes ações de preservação e difusão da memória do teatro e, posteriormente, das artes cênicas.

Foram muitos os agentes envolvidos na elaboração e execução de uma política de memória – funcionários, intelectuais e gestores – ao longo de mais de 15 anos de articulações em diversas frentes de atuação. Buscamos demonstrar alguns aspectos de um processo consistente de amadurecimento político, em que os projetos não foram descontinuados, mesmo com as diversas mudanças administrativas que ocorreram. Na verdade, eles eram os propulsores dessas transformações. Porém, isso não foi o suficiente para garantir sua continuidade em um momento adverso, quando o governo entendia ser necessário o enxugamento da máquina estatal. Todo o investimento até então realizado foi abruptamente desfeito.

Por fim, destacamos que os efeitos desse desmonte ainda podem ser sentidos no contexto político mais recente, quando, mais uma vez, “debates” sobre a eficiência do Estado desembocaram na extinção do Ministério da Cultura em 2019. Apesar de ter sido recriado em 2023, a arte e a cultura brasileiras ainda não desfrutam de uma posição sólida dentre as políticas de Estado, e se encontram, ainda hoje, sujeitas a ataques e descontinuidades. Tal situação reverbera diretamente sobre como o seu patrimônio (documental, edificado etc.) é preservado. Como diria Gilberto Gil, com toda sua poesia e assertividade: “O Brasil não pode continuar sendo sinônimo de uma aventura generosa, mas sempre interrompida”.66

Referências

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Recebido em 30/3/2023

Aprovado em 11/9/2023

Notas


1 O SNT foi criado em 1937, através do decreto-lei n. 92, de 21 de dezembro, com a finalidade de desenvolver e aprimorar o teatro brasileiro.

2 A Funarte foi criada em 1994, em sucessão ao Instituto Brasileiro de Arte e Cultura (1990-1994), resultado da reunião dos espólios da Fundação Nacional de Artes Cênicas (1987-1990), da Fundação do Cinema Brasileiro (1988-1990) e da Fundação Nacional de Arte (1975-1990). Todas essas instituições também derivavam de outros órgãos que lhes antecederam.

5 Brasil. Decreto n. 66.967, de 27 de julho de 1970.

6 José Maria Bezerra de Paiva (1932-2023), ou B. de Paiva, como era conhecido, foi professor, dramaturgo, escritor e gestor cultual. É considerado um dos precursores da implantação do ensino universitário de teatro no país. Atuou como encenador no Teatro Duse, de Paschoal Carlos Magno, no início de sua carreira, em meados dos anos 1950. Desde então iniciou profícua carreira no teatro. Foi professor e reitor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), lecionou na Fundação Brasileira de Teatro (FTB) e na Universidade Federal do Ceará (UFC).

7 Curso que deu origem à Escola de Teatro da Unirio a partir de 1979.

8 Orlando Miranda já possuía uma larga trajetória no setor cultural, com destaque para o teatro. Em 1965, um período em que pequenas casas de espetáculo eram abertas na Zona Sul carioca, uniu-se ao escritor Pedro Veiga e ao cenógrafo Pernambuco de Oliveira para fundar o Teatro Princesa Isabel, em funcionamento até hoje (Miranda, 2009).

9 SNT. Plano de Ação Cultural, 1974, p. 2. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte.

10 SNT. Plano de Ação Cultural, 1974, p. 5. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte.

11 SNT. Relatório de Atividades, 1974, p. 4. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte.

12 SNT. Plano de Ação Cultural, 1974, p. 8. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte.

13 Criada pela lei n. 6.312, de 16/12/1975, a Fundação Nacional de Arte (Funarte) gozava de autonomia administrativa, patrimonial e financeira, e era dotada de personalidade jurídica de direito privado.

14 Ministro da Educação e Cultura entre 1974 e 1978.

15 Entrevista de Orlando Miranda, em 1/3/2018.

16 SNT. Plano de Ação de 1976. Detalhamento de Despesas, p. 8. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte. Grifo no original.

17 SNT. Ofício circular n. 1, julho de 1978. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte, p. 2.

18 SNT. Plano de Ação de 1976. Detalhamento de despesas, p. 24. Arquivo institucional, Cedoc/Funarte.

19 Entrevista de Humberto Braga, em 25/5/2020.

20 SNT. Ofício circular n. 1, julho de 1978. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte, p. 3.

21 SNT. Ofício circular n. 1, julho de 1978. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte, p.2.

22 SNT. Relatório de Atividades 1978. s.p. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

23 SNT. Ofício circular n. 1, julho de 1978. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte, p. 1.

24 Jornal do Brasil, Caderno B, 21/8/1978. p. 5.

25 Jornal do Brasil, Caderno B, 21/8/1978. p. 5.

26 SNT. Relatório de Atividades. Projeto Memória das Artes Cênicas. 1978 a 1979. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

27 Jornal do Brasil, Caderno B, 21/8/1978. p. 5.

28 SNT. Relatórios de Atividades. Projeto Memória das Artes Cênicas. 1980 a 1981. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

29 Entrevista de Elizabeth Araújo, em 10/5/2018.

30 Entrevista de Elizabeth Araújo, em 10/5/2018.

31 Jornal do Brasil, Caderno B, 11/1/1980. p. 3.

32 Entrevista de Elizabeth Araújo, em 10/5/2018.

33 Entrevista de Elizabeth Araújo, em 10/5/2018.

34 Jornal do Brasil, Caderno B, 13/12/1981. p. 1.

35 Jornal do Brasil, Caderno B, 13/12/1981. p. 1.

36 Jornal do Brasil, Caderno B, 11/5/1982. p. 2.

37 Inacen. Relatório Janeiro/Agosto 1984. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

38 Manchete, 15/1/1983. n. 1.604. Ano 31. p. 119.

39 A biblioteca foi colocada como parte das ações de difusão cultural, em um primeiro momento. Inacen. Relatório Cenacen 1983. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

40 Entrevista de Clovis Levi, em 23/5/2020.

41 Inacen. Relatórios de Atividades. Cenacen 1983. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte; Inacen. Relatórios de Atividades. Divisão de Documentação 1982. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

42 A Luta Democrática, 13/8/1984. p. 5.

43 Jornal do Brasil, Caderno B, 24/5/1984. p. 2.

44 SNT. Relatório de Atividades. Projeto Memória das Artes Cênicas. 1978 a 1979. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

45 Inacen. Relatório de Atividades Cenacen 1986. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

46 Memorando de Janine Diamante para direção do Cenacen. 26/11/1985. Projeto Memória das Artes Cênicas. Memorandos expedidos 1982-1985. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

47 Entrevista de Tania Pacheco, em 14/4/2020.

48 Inacen. Relatório de Atividades Cenacen 1986. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

49 Brasil. Lei n. 7.624, de 5 de novembro de 1987.

50 Jornal do Brasil, 5/11/1987. Caderno B, p. 2.

51 Brasil. Decreto n. 95.675, de 27 de janeiro de 1988.

52 Inacen. Relatório de Atividades Cenacen, 1987, p. 4. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

53 Entrevista de Sonia Rummert, em 1/6/2020.

54 Nesse endereço, se situa, atualmente, o Cedoc/Funarte: rua São José, 50. Entretanto, a unidade se encontra em processo de transferência.

55 Entrevista de Tania Pacheco, em 14/4/2020.

56 Inacen. Relatório de Atividades 1987. p.16. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

57 Inacen. Relatório de Atividades Cenacen, 1988. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

58 Inacen. Relatório de Atividades Cenacen, 1988, p. 5. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

59 Nesse período foram captadas 145 novas doações e 248 realimentações, totalizando 393 inserções no acervo. Fonte: Inacen. Relatórios de Atividades. Projeto Memória – Campanha de Doação. 1986 a 1989. Arquivo institucional. Cedoc/Funarte.

60 Correio Braziliense, 11/8/1988. p. 2; Jornal do Brasil, Caderno B, 14/8/1988. p. 5.

61 Medida provisória n. 150, de 15 de março de 1990.

62 Medida provisória n. 151, de 15 de março de 1990. Além da Fundacen, também foram extintas as seguintes instituições: Funarte, Fundação Nacional Pró-Memória, Fundação Cultural Palmares, Fundação do Cinema Brasileiro (FCB), Fundação Nacional Pró-Leitura e Distribuidora de Filmes S.A. (Embrafilme).

63 Entrevista de Sonia Rummert, em 1/6/2020.

64 Brasil. Lei n. 8.029, de 12 de abril de 1990.

65 Através da medida provisória n. 610, de 8 de setembro de 1994, o Ibac passou a denominar-se Fundação Nacional de Artes (Funarte). Por essa razão, a atual Funarte é sucessora e não continuidade daquela criada em 1975, extinta em 1990.

66 Discurso de posse como ministro da Cultura, em 2 jan. 2003. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u44344.shtml.



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